São Paulo, segunda-feira, 19 de abril de 2010

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AMERICANAS

Falhas em lista de "terroristas" afetam vida de pessoas comuns

Por MIKE McENTIRE

Rahinah Ibrahim, estudante de doutorado na Universidade Stanford, chegou ao aeroporto de San Francisco com sua filha de 14 anos para embarcar em um voo das 21h para seu país de origem, a Malásia. Como tinha feito uma histerectomia havia pouco tempo, pediu uma cadeira de rodas.
Em vez disso, quando um funcionário da companhia aérea encontrou seu nome em uma lista de passageiros proibidos de viajar, Ibrahim foi algemada, revistada e detida, em meio a vários telefonemas envolvendo a polícia local, o FBI e o Departamento de Segurança Doméstica dos EUA. Duas horas depois de seu voo partir, ela foi liberada sem explicações. Viajou à Malásia no dia seguinte.
Quando tentou retornar aos EUA, porém, Ibrahim soube que seu visto fora revogado. E, quando prestou queixa, dizendo que não deveria constar da lista de terroristas a serem vigiados, a resposta do governo chegou um ano depois, em uma carta padronizada dizendo apenas que seu caso tinha sido revisto e que quaisquer modificações justificadas tinham sido feitas.
Todos os anos, milhares de pessoas se veem presas no processo de triagem de terroristas do governo americano. Algumas são vítimas de erros de avaliação ou de identidade, mas o simples fato de ter seu nome na lista as impede de ir ou vir dos EUA.
O processo decisório envolvido é tão sigiloso que não se pode informar pessoas se seus nomes estão na lista, por que razão estão nela e nem sequer se já foram tirados. Funcionários do governo dizem que o sigilo mantém os terroristas na incerteza. Mas defensores das liberdades civis afirmam que o segredo pode ocultar erros e impedir que pessoas assinaladas por engano procurem reverter essa situação.
Agora, cinco anos após a prisão de Rahinah Ibrahim no balcão da United Airlines, uma ação que ela moveu está começando a desgastar esse muro de sigilo. Em dezembro, um juiz federal ordenou que o governo libere os arquivos sobre a detenção de Ibrahim.
Muçulmana que foi aos EUA para estudar engenharia civil, Ibrahim, 44, impressionou seus colegas em Stanford. Um de seus orientadores, Raymond Levitt, disse que, entre as pessoas que pudessem eventualmente constar de uma lista de terroristas, Ibrahim "estaria no final".
O juiz William H. Alsup, que presidiu sobre a ação aberta por Ibrahim, também pareceu cético. "Acho que foi um erro monumental e que identificaram a pessoa errada", disse em dezembro.
As autoridades se negam a revelar por que suspeitaram de Ibrahim. Uma semana antes de seu voo previsto para a Malásia, em janeiro de 2005, Ibrahim recebeu a visita de dois agentes do FBI. "Eles chegaram a afirmar que não sabiam por que estavam ali para interrogá-la", disse sua advogada, Marza Elzankaly. "Apenas fizeram algumas perguntas sobre sua família, seu trabalho, seus planos de viagem e seu grau de instrução."
Quando o agente no aeroporto encontrou o nome de Ibrahim na lista de passageiros impedidos de voar, ele ligou para a polícia de San Francisco, que entrou em contato com a agência americana de segurança nos transportes (TSA), em Washington. Esta contatou um funcionário da United States Investigations Services, uma de várias empresas particulares que a agência contratou para conduzir seu centro de operações.
O boletim de ocorrência policial diz que o funcionário da empresa recomendou à polícia "não autorizar Ibrahim a embarcar no voo, contatar o FBI e detê-la para mais interrogatórios". Ela foi levada até uma subestação da polícia, onde foi revistada e posta numa cela. Um agente do FBI acabou ordenando sua soltura, acrescentando que ela estava sendo transferida para a lista dos passageiros aprovados para embarcar e que poderia viajar a seu país.
Ultrajada, Ibrahim decidiu abrir um processo por detenção injustificada. Mas a lei que criou a TSA tornou virtualmente impossível preparar uma contestação legal contra a agência. Em vez disso, a ação aberta por Ibrahim foca o Centro de Verificação de Terroristas do FBI, que não conta com as mesmas proteções legais.
"Se seu nome, meu nome ou o de qualquer outra pessoa presente neste tribunal fosse colocado nessa lista, seríamos gravemente prejudicados", disse o juiz Alex Kozinski em audiência em 2008. "Queremos ter alguma maneira de dizer 'veja bem, eu não deveria constar dessa lista'."
Enquanto isso, Ibrahim obteve seu doutorado de Stanford, mas não pôde retornar aos EUA para participar da ação legal. No mês passado, ela aceitou uma indenização compensatória de US$ 225 mil da polícia de San Francisco e da US Investigations Services. Mas ela prossegue com sua ação contra o governo federal.


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