São Paulo, segunda-feira, 21 de março de 2011

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Explorando mistérios da minoria canhota

Por PERRI KLASS, M.D.
Os humanos são animais assimétricos. No início do desenvolvimento embrionário, o coração se volta para a esquerda. O fígado se desenvolve à direita. Os pulmões direito e esquerdo têm estruturas distintas.
Há certas síndromes raras em que a assimetria normal dos órgãos se inverte -lembro-me como foi desconcertante ouvir os batimentos em lugares inesperados, na primeira vez que examinei uma criança com dextrocardia (coração no lado direito). Mas quando se trata da lateralidade, outra assimetria humana, que reflete a estrutura e função do cérebro, o padrão inverso é relativamente comum, mas não de fácil compreensão.
Ao longo dos séculos, os canhotos foram acusados de criminalidade e ligação com o demônio, e as crianças eram "re-educadas". Nos últimos anos, o estigma sumiu; quatro dos últimos sete presidentes dos EUA -Ford, Bush pai, Clinton e Obama- foram canhotos (Reagan é citado como ambidestro).
Mas a lateralidade continua sendo um enigma. Suas proporções -cerca de 90% das pessoas são destras, e 10% são canhotas- se mantêm ao longo do tempo. "Isso ainda é realmente misterioso", disse o geneticista Clyde Francks, que coordenou estudo na Universidade de Oxford que identificou variação genética ligada aos canhotos. A dominância de uma mão está relacionada à assimetria do cérebro. E, disse Francks, "nós estamos realmente muito no início da compreensão sobre o que torna o cérebro assimétrico".
Parece haver um consenso de que o cérebro humano é profundamente assimétrico, e que entender tal assimetria vai nos mostrar sobre quem somos e como nosso cérebro funciona.
A lateralidade cerebral -a distribuição das funções entre os hemisférios direito e esquerdo- é crucial para a compreensão da linguagem, do pensamento, da memória e talvez até da criatividade. Há anos, a mão dominante é vista como um sinal externo a respeito do equilíbrio entre os lados direito e esquerdo do cérebro. Para os destros, a atividade da linguagem é predominantemente no hemisfério esquerdo. Muitos canhotos também têm a linguagem dominante no lado esquerdo, mas um número significativo possui essa função distribuída de modo mais uniforme ou concentrada no hemisfério direito. Lateralidade é coisa de família. O estudo de 2007 identificou um gene, o LRRTM1, descoberto no decorrer do estudo com crianças disléxicas e que acabou associado ao desenvolvimento do canhotismo.
Francks, que hoje trabalha no Instituto Max Planck de Psicolinguística, na Holanda, lembra que a descoberta atraiu muita atenção, pois esse gene também foi encontrado desproporcionalmente em esquizofrênicos, embora nenhuma dessas correlações seja simples ou bem compreendida. O gene afeta a forma como os neurônios se comunicam, mas os seus mecanismos ainda precisam ser estudados. Os pesquisadores continuam procurando ligações entre canhotismo e outras condições, como transtornos imunológicos, problemas de aprendizagem e dislexia, redução da expectativa de vida e esquizofrenia.
O percentual de canhotos na população parece ser constante, em torno de 10%. Isso é provado por estudos das pinturas rupestres, observando a mão que os caçadores usavam para empunhar suas lanças, e às análises de artefatos antigos. Assim, apesar do preconceito no passado e de possíveis riscos ao desenvolvimento, ser canhoto "claramente deve ter vantagens também", disse Daniel Geschwind, professor de genética, neurologia e psiquiatria na Universidade da Califórnia, em Los Angeles.
No entanto, acrescentou ele, "ninguém sabe por que isso se mantém assim."


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