São Paulo, segunda-feira, 21 de setembro de 2009

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DINHEIRO & NEGÓCIOS

Lego avança além dos blocos


Enfrentando riscos, ícone dos brinquedos se reconstrói


Por NELSON D. SCHWARTZ

BILLUND, Dinamarca - Cinco anos depois de uma experiência quase mortal, a Lego surge como um vencedor improvável em uma indústria ameaçada pelos videogames, o iPod, a internet e outras diversões digitais.
Enquanto outros fabricantes de brinquedos se debatem, essa empresa dinamarquesa de tijolos de brinquedo contabiliza vendas de dois dígitos e lucros crescentes. Nos últimos anos, a Lego se concentrou mais em brinquedos que muitos pais não reconheceriam de sua própria infância. Os temas de Hollywood estão exigindo mais espaço nas prateleiras, algo muito distante das brincadeiras idealistas, orientadas puramente pela imaginação, que conduziram a Lego durante anos e foram tanto uma religião quanto uma estratégia de negócios.
Assim como os brinquedos estão mudando, a companhia também mudou. Jorgen Vig Knudstorp, 40, pai de quatro e que assumiu como executivo-chefe da Lego em 2004, deixou claro que os resultados, e não simplesmente sentir-se bem por fazer os melhores brinquedos, seriam essenciais para o êxito da Lego.
"Precisávamos construir uma mentalidade em que o mau desempenho não fosse aceito", diz Knudstorp. Hoje, "não há lugar para se esconder se o desempenho for fraco", ele diz.
No mês passado, a Lego abriu sua primeira "loja conceito" em Concord, Carolina do Norte, aonde os pais podem levar seus filhos para festas de aniversário e aulas com construtores. Tudo faz parte de uma expansão que dará à Lego 47 lojas em todo o mundo até o fim deste ano, contra 27 em 2007.
Fundada em 1932 sobre o princípio de "brincar bem", ou "leg godt" em dinamarquês, pelo carpinteiro local Ole Kirk Christiansen, essa companhia privada tinha uma aversão muito escandinava a falar em lucros, quanto mais a orientar a empresa em torno deles.
A família Christiansen ainda é proprietária da Lego, e seu negócio ainda pode ser diversão e jogos, mas trabalhar ali não é. Antes da chegada de Knudstorp, os prazos não eram cumpridos, e o tempo de desenvolvimento de novos brinquedos podia se estender por anos; em 2004, a empresa teve prejuízo de US$ 344 milhões.
Hoje, o pagamento dos funcionários está ligado aos principais indicadores de desempenho da direção. E toques para economizar custos são incentivados quando se trata de projetar novos brinquedos. Isso ajudou a diminuir o tempo de desenvolvimento em 50%, com alguns novos produtos passando da ideia à embalagem em menos de um ano.
No entanto, a Lego não aboliu totalmente seu sentido escandinavo de missão social. Ela manteve a alta qualidade e nunca mudou qualquer fábrica para a China, evitando o temor da tinta com chumbo e ganhando participação de mercado enquanto rivais caíam em meio a diversos recalls.
Hoje, com os lucros em alta, a Lego se prepara para um futuro que vai muito além do tijolo básico, mas que também encerra riscos.
Os videogames -sim, a Lego também está lá- são cada vez mais importantes para a empresa, assim como as legiões de fãs adultos do Lego, que hoje podem comprar kits para construir modelos como o do museu Guggenheim. Além disso, a companhia negocia com a Warner Brothers um filme misto de animação e ação, com tema da Lego.
"Desenvolver um filme não é barato", diz Soren Torp Laursen, funcionário da Lego há 23 anos que dirige suas operações na América do Norte. "Mas, cinco anos atrás, estávamos no meio de uma crise e hoje estamos em fase de crescimento. Definitivamente assumimos mais riscos."
Essa mudança decepcionou os puristas, mas tem trazido recompensas, pelo menos em curto prazo.
Em meio a uma queda de 5% nas vendas totais de brinquedos nos EUA no ano passado e a pior temporada de Natal da indústria em três décadas, segundo o analista Sean McGowan, da Needham & Company, as vendas da Lego subiram 18,7% em 2008. E, apesar de uma piora na recessão global, a Lego se fortaleceu no primeiro semestre deste ano, com aumento de 23% das vendas em relação ao mesmo período de 2008.
Os números são ainda mais impressionantes diante da queda das vendas neste ano nos dois maiores fabricantes de brinquedos, Mattel e Hasbro.
"Afinal, você tem de ir aonde seu consumidor está indo", diz John Barbour, ex-executivo da rede de lojas de brinquedos Toys "R" Us. "E a realidade é que as crianças querem temas de filmes. Não adianta desenvolver o melhor produto do mundo se você não puder colocá-lo nas prateleiras."


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