São Paulo, segunda-feira, 22 de março de 2010

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LENTE

Traçando o instinto de fazer o bem

A interminável narrativa de cobiça e violência ao longo da história sugere que os humanos simplesmente nasceram para serem maus.
Mas novas pesquisas indicam que o altruísmo está impresso nos circuitos de todos, menos dos piores sociopatas, como resultado de uma evolução que, ao longo dos milênios, impediu que as sociedades descambassem para a anarquia.
Os estudos com bebês revelam uma inclinação inata para ajudar, relatou o "New York Times", mesmo antes que o processo de socialização seja totalmente iniciado. Aos três anos, crianças em grupo adotam regras sociais, assim como faziam as sociedades extrativistas, quando isso era uma questão de sobrevivência.
Jane E. Brody escreveu no "Times" que alguns especialistas acreditam que os bebês revelam empatia quando choramingam ao escutar outra criança chorando, ou quando estendem um brinquedo ou cobertor a um amigo chateado.
O primatologista Frans de Waal, autor de "The Age of Empathy" ("A idade da empatia"), tem focado suas pesquisas na agressão, mas concluiu que ela recebe importância exagerada, já que a seleção natural teria favorecido a cooperação. "Somos programados para estender a mão", escreveu De Waal. "A empatia é uma resposta automatizada sobre a qual temos controle limitado."
Exames de ressonância magnética corroboram isso, revelando uma alta atividade nos centros de prazer durante tarefas de cooperação social. Como escreveu Natalie Angier, do "Times", "as pessoas cooperam porque a sensação é boa".
Mesmo ateus convictos podem admitir que essa inclinação natural à cooperação talvez tenha sido historicamente canalizada pela religião. Novamente, isso pode vir das primeiras sociedades extrativistas. Nicholas Wade, repórter do "Times" e autor de "The Faith Instinct" ("O instinto da fé"), sugere que a religião pode ter "unido as pessoas, comprometendo-as a colocar a necessidade da sua comunidade acima do seu interesse próprio".
E, embora os humanos possam ter bagunçado o planeta, a ânsia de limpá-lo pode ser inata também. Numa recente edição da revista dominical do "Times", Daniel B. Smith escreveu sobre o "inconsciente ecológico" coletivo. Especialistas no campo da ecopsicologia acreditam que a evolução da mente humana foi tão interconectada com a natureza que desligar-se dela pode ser profundamente nocivo.
"O desespero e a ansiedade são as consequências de rejeitar instintos ecológicos profundamente arraigados", escreveu Smith, acrescentando que "um ambiente em perigo cria uma mente em perigo".
A ciência talvez não responda se os humanos farão o que é certo para o planeta. Mas alguns otimistas na comunidade científica salientam que essas ânsias inatas de cooperação, altruísmo e preservação da natureza vão continuar nos guiando.
"Eu argumentaria que a biologia constitui a nossa melhor esperança", escreveu De Waal. "Não há como não estremecer diante do pensamento de que a humanidade das nossas sociedades dependeria dos caprichos da política, da cultura ou da religião."
KEVIN DELANEY



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