São Paulo, segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

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Para proteger o esquilo vermelho, coma o cinzento

Por MARLENA SPIELER

Rosbife mal-passado com molho, carne de porco envolta em torresmo, frango... são essas as carnes que vêm à mente quando se pensa na culinária britânica. Recentemente, porém, uma nova carne chegou às mesas do Reino Unido: a de esquilo.
A carne de esquilo já figurou ocasionalmente na cozinha britânica, mas, historicamente, não tem sido uma das opções prediletas dos ingleses. Mesmo durante a Segunda Guerra Mundial e o período de austeridade que a seguiu, quando o Ministério da Alimentação promoveu ativamente as sopas e tortas de esquilo, os carnívoros respondiam "não, obrigado".
Hoje em dia, porém, toda a carne de esquilo que os caçadores obtêm é vendida rapidamente.
"O interesse se deve em parte à curiosidade", disse Barry Shaw, da empresa Shaw Meats, que vende carne de esquilo no Mercado de Produtores de Wirral, perto de Liverpool.
Alguns podem ter dificuldade em fazer o aspecto saboroso do esquilo superar seu lado bonitinho -o rosto adorável, as patinhas minúsculas-, mas muitos acham que comer carne de esquilo é uma maneira de ajudar o meio ambiente e, ao mesmo tempo, ter uma experiência gastronômica diferente.
Milhões de esquilos povoam a Inglaterra, a Escócia e o País de Gales, tanto que sua população precisa ser controlada com abates. Isso significa que caçadores, guarda-caças e a Comissão de Administração Florestal garantem um suprimento regular da carne a açougueiros, restaurantes e produtores de patês e tortas britânicos.
A situação não se resume apenas ao excesso de esquilos. Na verdade, há uma guerra em curso entre os esquilos: os invasores (esquilos cinzentos vindos da América do Norte nos últimos cem anos ou mais) estão tomando os espaços do esquilo vermelho natural do Reino Unido, um ícone britânico imortalizado pela escritora Beatrix Potter e amado por gerações desde então.
Os esquilos cinzentos invadem os hábitats dos vermelhos, comem com voracidade e carregam um vírus que é capaz de devastar os vermelhos.
"Quando os esquilos cinzentos aparecem, expulsam os vermelhos", explicou Rufus Carter, diretor da empresa Patchwork Traditional Food Company, sediada no País de Gales, que pretende vender patê de esquilo e avelãs em seu website.
A campanha "salve um vermelho, coma um cinzento!" foi lançada em 2006, para proteger os esquilos vermelhos, aguçando o apetite dos consumidores por seus primos norte-americanos invasores .
Muitos gostam de comer esquilo simplesmente por apreciar seu sabor. Carter contou que, na primeira vez em que experimentou, não sabia o que era. Mas "achei uma delícia, desde a primeira mordida".
Nichola Fletcher, que escreve sobre comida e é dona de uma criação de cervos para abate, promoveu um evento de degustação de esquilos para o Sindicato de Jornalistas de Culinária britânicos e achou que "o sabor delicioso lembra as avelãs que os esquilos consomem". Num evento posterior, ela considerou o sabor decepcionante, "com textura gordurosa e sabor desagradável", presumivelmente refletindo a dieta dos animais.
Fergus Henderson, chef e coproprietário de um restaurante em Londres, inclui a carne de esquilo em seu cardápio "sazonalmente". Embora a carne possa ser encontrada o ano inteiro, é na primavera, depois de finda a temporada de caça, que os moradores da zona rural podem se concentrar em controlar a população de esquilos.
Henderson às vezes prepara os esquilos "de modo a recriar os bosques de onde vêm", assando-os na panela com bacon, "pé de porco, cogumelos porcini e cebolinhas, para recriar o chão da floresta".
Seria possível imaginar que, ante sua fartura, a carne de esquilo seria uma opção ótima para enriquecer as refeições britânicas nestes tempos de dificuldade econômica, mas é muito difícil retirar a carne e a pele dos esquilos, mesmo dos mais rechonchudos. Por essa razão, disse Carter, muitos caçadores, guarda-caças e chefs "preferem não se dar ao trabalho".


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