São Paulo, segunda-feira, 23 de novembro de 2009

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TENDÊNCIAS MUNDIAIS

Empresas encontram funcionários motivados na Índia rural

Por LYDIA POLGREEN
BAGEPALLI, Índia Sob fortes luzes fluorescentes, dezenas de cabeças se dobram sobre teclados, e o batuque uníssono da digitação enche a sala. Os monitores brilham com formulários de seguros, cronogramas e mensagens eletrônicas do serviço aos clientes, tarefas enviadas de longe para serem processadas na Índia por um baixo valor.
Essa cena se desenrola em cidades de toda a Índia, especialmente nos polos de alta tecnologia de Bangalore e Gurgaon, lugares que são sinônimo da revolução informática que transformou a economia indiana e empurrou o crescimento do país.
Mas os trabalhadores em questão são jovens de aldeias em torno de Bagepalli, pequena cidade no interior do Estado rural de Karnataka. Eles fazem parte da experiência de um grupo de empresários para levar empregos terceirizados a rincões distantes da Índia, que em geral ficaram isolados de seu crescimento econômico.
Há apenas cerca de 1 milhão de trabalhadores nos agitados call centers e modernos campi de empresas tecnológicas que passaram a simbolizar o boom indiano um pequeno número, diante da população do país, de 1 bilhão.
Quase todos esses empregos estão nas cidades. Mas 70% dos indianos vivem nas áreas rurais. A Índia de modo geral saltou ou nunca alcançou a fase industrial de desenvolvimento que poderia ter levado as massas rurais para as cidades. Alguns economistas afirmam que ainda há necessidade de uma rápida urbanização para que o país possa se tornar uma grande potência econômica e fornecer empregos para suas legiões de desempregados.
Mas os fundadores da Rural Shores, empresa que está montando escritórios terceirizados em áreas rurais, diz que faz mais sentido levar o trabalho para onde as pessoas estão. "Nós pensamos: por que não levar os empregos para as aldeias?", disse G. Srinivasan, diretor da companhia. "Há muitos talentos lá, e podemos treiná-los."
A Índia rural já foi considerada um peso morto na economia indiana, um bastião de atraso. Mas empresas indianas e estrangeiras começaram a ver de modo diferente as áreas distantes do país, como um mercado não aproveitado para produtos relativamente baratos, como celulares de baixa tecnologia, utensílios de cozinha e motocicletas baratas.
Hoje, algumas empresas começaram a ver na Índia um suprimento inaproveitado de trabalhadores de escritório muito motivados. A Rural Shores contratou cerca de cem jovens, a maioria deles com diploma colegial e com um pouco de faculdade, todos de áreas rurais em torno de Bagepalli. A companhia tem três centros e pretende abrir 500 no país até 2014.
A maioria dos empregados do centro são os primeiros membros de suas famílias a trabalhar em escritório. Falam um inglês mediano, mas têm habilidade suficiente com o idioma para fazer o registro básico de dados, ler formulários e escrever e-mails simples.
Com aluguéis e salários muito mais baixos do que em centros semelhantes nas cidades, a empresa diz que pode fazer o mesmo trabalho que outras terceirizadas pela metade do preço. Um trabalhador de escritório em Bangalore com capacidade semelhante à dos trabalhadores de Bagepalli recebe cerca de 7.000 rupias por mês, ou R$ 225, disse Srinivasan. Nas pequenas cidades e aldeias, um salário mínimo de cerca de R$ 102 por mês é considerado excelente.
Em Bagepalli, a maioria dos trabalhadores são filhos de agricultores e muitas vezes a primeira geração a terminar o colegial. Para muitos, um emprego em um centro de terceirização é uma oportunidade inédita. K. Aruna, 19, vive com sua mãe viúva e a irmã mais nova numa casa de dois quartos em uma rua estreita e enlameada de uma aldeia nas proximidades de Bagepalli. Antes que Aruna conseguisse um emprego na Rural Shores, a família subsistia com os produtos de sua pequena fazenda e duas vacas. Às vezes elas lutavam para conseguir R$ 35 por mês, entre as três. Mal podiam comprar legumes.
Em seu novo emprego, hoje Aruna ganha mais de R$120 por mês. A família comprou alguns móveis um guarda-roupa e novos sáris e joias. Quando ela chegou em casa com o crachá do escritório pendurado no pescoço, toda a aldeia ficou pasma. "Sou a única pessoa da aldeia que trabalha em um escritório", disse Aruna, mexendo no brinco de ouro em forma de lágrima que comprou. "Nunca pensei que isso seria possível."


Colaborou Hari Kumar



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