São Paulo, segunda-feira, 25 de julho de 2011

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Filme de críquete fala de questão social

Por BAZ DREISINGER

"Fire in Babylon" (fogo na Babilônia), altamente elogiado pela crítica em sua première recente em Londres, é um documentário sobre a seleção de críquete do Caribe que derrotou a Inglaterra e a Austrália e ficou invicta no mundo por 15 anos seguidos nas décadas de 1970 e 1980 -a era de Bob Marley, dos movimentos antiapartheid e dos tumultos raciais em Londres.
O diretor Stevan Riley disse que seu objetivo foi "contar uma história acessível para todos, não apenas para os fãs do esporte", e que mergulhou em questões sociais -nem sempre para a satisfação dos retratados no filme.
"O críquete é um veículo para relatar uma história muito mais profunda sobre a conquista da identidade e da liberdade, sobre a luta e o orgulho negros", afirmou Riley.
A trama começa nos anos 1960 com o críquete, que tem uma história densa no antigo império britânico e é um esporte muito popular em todo o Caribe.
Inicialmente restrito aos colonizadores brancos, mais tarde o esporte se difundiu também entre os colonizados. Para estes, trajar as roupas brancas do críquete carregava um sentido simbólico: imitar o senhor, absorvendo suas normas e etiqueta sociais.
Com a trilha sonora de "Fire in Babylon" formada por reggae com baixos fortes, os arremessos velozes também passam a simbolizar a libertação negra pós-colonial.
"A seleção caribenha representava os mais marginalizados ascendendo até o topo: uma população antes escrava voltando para enfrentar seus senhores coloniais, ou uma população imigrante derrotando os seus anfitriões ingleses", disse Riley.
O próprio título do filme faz alusão a isso. No jargão rastafari, "Babilônia" é a estrutura de poder imperialista que historicamente oprimiu os povos colonizados, e o fogo pode aniquilar essa estrutura.
Essa narrativa racial torna mais familiar ao público uma história sobre o críquete e o Caribe, mas alguns ex-jogadores caribenhos dizem que ela é enganosa.
Colin Croft, natural da Guiana e antigo jogador da seleção caribenha, diz que "o filme apresenta um time formado predominantemente por negros e que tenta dominar um mundo branco, e não foi assim, de maneira alguma".
"A gente não corria para arremessar rápido porque o sujeito na outra ponta era branco", disse. "Arremessávamos para paquistaneses ou indianos com tanta velocidade quanto para jogadores da Inglaterra ou Austrália", afirmou.
A seleção caribenha tinha não apenas jogadores negros, mas também brancos e pessoas de origem asiática, de Trinidad e da Guiana. "O filme relata muito bem uma história sobre a ascensão da região caribenha e da identidade caribenha", disse Michael Holding, jamaicano e ex-jogador da seleção. "Mas exagera o ângulo racial".
Harvey Neptune, professor de história caribenha na Universidade Temple, na Pensilvânia, disse que a preferência do filme pelo reggae em detrimento do calipso -outra característica que provavelmente fará com que agrade a um público mais amplo- passa por cima da ligação mais longa e fiel do calipso com o críquete.
Mas Neptune destacou que, mesmo assim, as vitórias da seleção caribenha tiveram realmente um significado que transcendeu os campos de críquete: "Porque esses jogadores negros estavam ganhando -e ganhando de uma maneira que rejeitava boa parte da ortodoxia do críquete-, as performances triunfais deles assumiam um significado insurgente tremendo, não menor que o punho cerrado do poder negro", afirmou.
Para Riley, é nisso que consiste o final feliz do documentário e o segredo de fazer um filme que transcende o esporte. "Quando você tem uma finalidade mais profunda, como a que a seleção caribenha encarnava, o esporte pode tornar-se símbolo de algo muito mais profundo".


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