São Paulo, segunda-feira, 28 de março de 2011

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Laboratório da solidão autossustentável

Por PENELOPE GREEN

TERLINGUA, Texas - Não é fácil encontrar o Laboratório de Campo, uma chácara nos confins do deserto texano, a uns 50 km do México. Mas John Wells, que construiu o lugar e lá vive, fica feliz com visitas.
Essa região desolada, conhecida localmente como "Paisagem Lunar", tem terras áridas e baratas, sendo, portanto, tentadora para quem busca uma vida autônoma, como Wells. Não há estradas asfaltadas, eletricidade nem água corrente. Em compensação, é fácil ver a Via Láctea.
Com sua barba comprida, chapéu de caubói e botas surradas, Wells, 51, parece ser um nativo. Mas, como muitos aqui, ele é um recém-chegado -no caso, um ex-fotógrafo de moda e de catálogos em Nova York.
Seguindo uma longa tradição de retorno ao campo, Wells partiu atrás de uma vida mais modesta, querendo domar o ambiente rude para atender estritamente às suas necessidades frugais. Energia eólica ou solar? Quanta água você pode acumular em meia hora de chuva? Dá para represar uma valeta? Como construir um refrigerador evaporativo? Quanto tempo leva para um pedaço de frango assar num forno solar? "Se não desse certo", disse ele, "o investimento foi tão barato que eu poderia simplesmente ir embora".
Em outubro de 2007, Wells comprou 16 hectares por US$ 8.000, acrescentando depois outros oito hectares por US$ 5.000. Gastou nove dias e US$ 1.600 para construir o exterior da sua moradia de um cômodo, primeira estrutura em um terreno que agora inclui quatro contêineres de carga debaixo de um imponente teto arqueado, apoiado em vigas metálicas -tudo construído por ele mesmo.
Ele chamou o lugar de "Laboratório Vivo de Campo de Energia Alternativa e Sustentável do Sudoeste do Texas" -ou "Laboratório de Campo" para os íntimos.
No verão seguinte, ele já tinha um blog detalhando suas dificuldades cotidianas e seus pequenos triunfos. Às vezes, escreveu ele no início, "é difícil dizer se eu estou andando em algum planeta distante ou apenas perdido no deserto".
Dois anos depois, ele já havia registrado 200 mil visitantes no blog, sendo cerca de 800 leitores regulares.
Numa recente visita, Wells fumava um cigarro atrás do outro.
Os quatro contêineres brancos rodeiam o pátio. Um guindaste os ergueu sobre blocos de concreto, mas foi Wells, sozinho, quem os ajeitou com um macaco de carro.
Neste ano, ele vai construir canteiros elevados para hortaliças. Um dos contêineres está preparado para hóspedes, mas Wells planeja se mudar para lá em breve, construindo outro edifício para convidados.
O minúsculo barraco onde ele dorme tem uma escrivaninha, uma cama retrátil e um balcão da cozinha; o lustre é uma lata de suco de tomate.
Para trabalhar sozinho, é preciso ser paciente, e a segurança é fundamental. "Quando os contêineres foram entregues, eu me lembro de ter pensado: 'E se a porta bater, e eu ficar preso por dentro?'", contou Wells. "O que eu percebi é que a webcam [ligada diariamente] é uma segurança. Sempre tem alguém me vendo."
Em 2001, Wells comprou uma mansão rural em estilo neogrego em Spencertown, Nova York, uma pequena aldeia a 180 km de Manhattan, e saiu da cidade.
Custou-lhe US$ 255 mil, e, após seis ou sete anos, o IPTU havia passado de US$ 6.000 para US$ 12 mil. Ele estava endividado em US$ 67 mil. "Eu não conseguia nem mesmo aproveitar aquele casarão", disse ele.
Quando leu uma reportagem sobre um casal que estava pouco a pouco conectando turbinas eólicas à sua casa de barro, no oeste do Texas, foi lá visitar. Ele se lembra de ter pensado, ao ver aquilo: "Quem, diabos, poderia viver aqui?".
Isso foi em fevereiro. Em março, ele vendeu sua casa por US$ 600 mil e pagou as dívidas. Em seguida, cancelou o cartão de crédito. Após se desfazer de objetos para que tudo coubesse num caminhão alugado, rumou para o oeste.
Gastou cerca de US$ 35 mil no terreno: cada caixa d'água custa cerca de US$ 1.000 (ele tem nove); painéis solares e baterias, uns US$ 2.500; os contêineres, com instalação, cerca de US$ 20 mil.
Seus custos fixos são mínimos: US$ 86 por ano de IPTU, pouco mais de US$ 80 por mês de internet e telefone (foram US$ 10 para enterrar os cabos e levá-los até a propriedade); US$ 280 mensais de plano de saúde (mais US$ 50 anuais para garantir remoção médica por helicóptero); US$ 750 por ano de seguro do caminhão.
Wells está mais do que satisfeito por viver sozinho. "A ideia de comprometer o meu dia não me agrada", disse.
Mas ele está feliz também por unir os outros. Ordenou-se pastor pela internet e, há dois anos, casou amigos aqui; na ocasião, Wells usava o chapéu de caubói.


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