São Paulo, segunda-feira, 30 de março de 2009

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Colheita provoca atritos na Andaluzia

Por VICTORIA BURNETT

LEPE, Espanha - José María Gómez Jimenez pensou que seus dias de trabalho no campo andaluz tinham terminado. Na maior parte dos últimos oito anos, Gómez, 29, ganhou cerca de R$ 4.200 por mês rebocando paredes e trabalhando nos fins de semana como cozinheiro nesta próspera cidade produtora de morangos. Ele comprou um apartamento, frequentava festas depois do trabalho e usava tênis da moda. Um ano atrás, Gómez perdeu o emprego na construção. Hoje ele colhe morangos por R$ 2.500 ao mês em uma fazenda perto de Lepe, na Província de Huelva, Andaluzia (sul da Espanha). "Colher morangos é o último recurso, mas não há outra coisa", disse Gómez. "As vacas gordas se foram, e agora é a vez das vacas magras."
Enquanto os empregos desaparecem em toda a Andaluzia, trabalhadores como Gómez estão voltando aos campos que abandonaram pelos canteiros de obras, hotéis e lojas durante os dez anos de boom econômico na Espanha. Eles concorrem com os migrantes que os substituíram, alimentando um ressentimento que pode se tornar explosivo. Huelva, um dos maiores produtores mundiais de morango, tornou-se um polo de atração para a mão de obra estrangeira nos últimos anos. Como os fazendeiros espanhóis não encontravam trabalhadores locais suficientes, trouxeram milhares de colhedores de frutas de países como Marrocos e Romênia.
Mas, com o aumento do desemprego, a região tornou-se um exemplo de atrito entre trabalhadores nacionais e estrangeiros, sindicatos e agricultores. O índice de desemprego na Andaluzia atingiu 22% no fim do ano passado, muito acima do índice nacional de 14% e três vezes a média da União Europeia.
"Temos campos cheios de imigrantes, e os habitantes das aldeias estão sem trabalho", disse Malu Escobar Cobos, 23, que perdeu o emprego de caixa de supermercado em Lepe há cinco meses e procurava trabalho na fazenda onde Gómez trabalha. O patrão de Gómez, José María Madrigal, disse que cerca de 30 pessoas por dia aparecem em busca de emprego, entre locais e imigrantes. "Em parte é nossa culpa, porque nós espanhóis não queríamos trabalhar nos campos", diz Escobar. "Mas, agora que não há trabalho na cidade, eles têm de encontrar um equilíbrio."
Os agricultores disseram que, quando fizeram sua ronda de recrutamento, em setembro, poucos locais se candidataram aos empregos. Os fazendeiros contrataram cerca da metade dos 50 mil catadores de frutas da safra no exterior, apenas alguns milhares a menos que o total do ano passado. A outra metade é uma mistura de espanhóis e imigrantes residentes na Espanha. Mas quando a colheita começou, no final de fevereiro, muitos locais, sem trabalho havia meses, já estavam desesperados. Eles realizaram protestos ao redor do cinturão do morango, ameaçando ocupar as fazendas se os produtores não contratassem mais gente local.
Mas há outro grupo na dura disputa pelos empregos agrícolas: centenas de trabalhadores diários imigrantes que vivem em abrigos improvisados. Entre eles está Bouba Gul, 27, senegalês que divide com oito homens uma barraca feita de plástico e cobertores velhos. Toda manhã, Gul caminha cerca de cinco quilômetros até as fazendas próximas para pedir emprego, até agora sem sucesso. "Se soubesse que a Europa era assim, não teria vindo", disse Gul.


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