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São Paulo, domingo, 28 de dezembro de 2003

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OMBUDSMAN

Ano exuberante

BERNARDO AJZENBERG

Os acontecimentos fizeram de 2003 um ano exuberante no que toca a questões fundamentais para o jornalismo:
1) A independência da mídia se colocou de modo diferente sob um novo governo. Após uma "lua-de-mel" entre a maior parte dos veículos e o Planalto, a cena mudou. Houve cobranças, dificuldades no contato, excessos. Lula, dias atrás, proferiu a (polêmica) frase do ano nessa matéria: "Eu aprendi uma coisa: notícia é aquilo que nós não queremos que seja publicado. O resto é publicidade".
A mídia dos EUA viveu um debate semelhante, com a invasão e ocupação do Iraque. Cabe patriotismo no noticiário de uma imprensa crítica? Como a mídia e o Pentágono usaram, cada qual a seu modo, os repórteres "encaixados" nas tropas?
2) Casos históricos abalaram a credibilidade de três das maiores instituições de mídia do planeta.
O primeiro foi o de Jayson Blair, o repórter demitido do "New York Times", em maio, após descoberta de fraudes em suas reportagens. O jornal expôs os erros. Fez mea culpa. Uma investigação interna resultou em demissões na cúpula e em mudanças estruturais, dentre elas a adoção de um ombudsman.
Ainda no primeiro semestre, explodiu a crise na BBC, da Grã-Bretanha, com o suicídio de um assessor científico do governo, fonte secreta de um jornalista que teve sua identidade revelada após esse mesmo jornalista "inflar" suas afirmações sobre o potencial bélico de Bagdá.
No mesmo período, o principal diário francês, "Le Monde", sofria acusações, em livros, de condução editorial deturpada por vínculos políticos e econômicos.
3) No Brasil, as entidades das empresas de comunicação assumiram a existência de uma crise empresarial e pediram ajuda ao BNDES. Em que pese a falta de transparência com que o tema foi e continua a ser tratado na própria mídia, o gesto expressa, em si, a gravidade da situação.
4) Em vários países, em especial EUA e Itália, a discussão, no terreno empresarial, versou sobre propostas de leis que ampliam a chance de concentração da propriedade dos meios de comunicação, com o que isso acarreta de ameaça à pluralidade e à diversidade.
5) Dois episódios, de proporções limitadas mas alto valor simbólico, chamaram a atenção para os riscos da crescente "fusão" entre jornalismo e entretenimento. Foram o "sarro" de Silvio Santos, que numa revista anunciou estar próximo da morte, e a "entrevista" do Gugu com supostos membros do PCC.
6) Ao longo do ano, a Folha protagonizou três casos relativos ao direito da sociedade de ter acesso a informações públicas. Em maio, o tema foram os critérios da prefeitura de São Paulo para fixar valores da taxa do lixo. Em julho, contratos sem licitação do governo do RJ. Em novembro, a verba indenizatória dos deputados federais. Em todos, ante a resistência das autoridades, o jornal fez pedido formal de dados, com base na Constituição. Iniciativa ainda incomum, que abre nova perspectiva ao debate sobre mídia, Poder e transparência.
O ano de 2003 ainda gerou, concretamente, polêmicas sobre ética jornalística, assassinato de repórteres, mistura de jornalismo com publicidade...
Na certa faltaram eventos relevantes nesse resumo. Mas, se fosse "apenas" isso, não bastaria para um ano só?

 

Entro em férias. A coluna volta em 8 de fevereiro. Nesse período, a secretária Rosângela Pimentel, do departamento do ombudsman, receberá e encaminhará as mensagens dos leitores. Quando necessário, casos serão tratados no meu retorno. Até lá.



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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor -recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
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