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OMBUDSMAN
Perdidos no zôo
BERNARDO AJZENBERG
Seria um erro questionar a
primazia institucional e a
prioridade jornalística de um caso como o do ex-assessor do Planalto Waldomiro Diniz, suas
implicações e consequências.
Ao menos nas últimas semanas, é esse o tema a exigir e merecer mais espaço e maior investimento na apuração noticiosa.
A morte de quase sessenta animais por envenenamento ao
longo de um mês no zoológico de
São Paulo lançou para a mídia,
porém, um outro desafio.
Pois, se repórteres de política
estão -infelizmente- habituados a investigar corrupção e jogo
de poder, conhecendo disso ao
menos o início do "caminho das
pedras", o mesmo não ocorre ante episódios inusitados como a
morte em série de porcos-espinhos, dromedários, elefantes,
chimpanzés e outras espécies.
Uma leitura da cobertura da
mídia de 6/2, quando as TVs divulgaram pela primeira vez a
matança, até a última sexta revela que ela se dedicou ao assunto quase cotidianamente.
No entanto, com raríssimas exceções, o noticiário limitou-se a
reproduzir informações ou declarações de fontes oficiais ou de
especialistas: polícia, Ministério
Público, direção do zôo, toxicologistas, biólogos, políticos, autoridades, veterinários, funcionários, visitantes, peritos.
Sem esse conjunto de referências, é óbvio, não havia como
dar conta minimamente dos fatos nem das hipóteses aventadas
para chegar à raiz do "mistério".
Mas isso é o elementar.
Onde esteve a investigação jornalística independente, reveladora, capaz de antecipar fatos
ou tendências, expor contradições, trazer elementos novos?
Passado mais de um mês desde
as primeiras mortes, ela não
apareceu. Daí a indesejável homogeneidade, uma sensação de
quase indiferenciação entre as
notícias publicadas pelos diversos veículos de comunicação sobre o andamento do caso.
Registre-se que, na sexta, citando um diretor do parque, a
Folha revelou algo importante,
uma pista diferente: a grande
quantidade (40) de porcos-espinhos no grupo de bichos envenenados poderia estar relacionada
a um leilão de animais marcado
para acontecer no próximo mês,
sendo fruto, assim, da ação deliberada de um grupo com interesses específicos em prejudicar o
zoológico. A conferir.
No mais, como costuma ocorrer em casos policiais complexos,
vemo-nos perdidos, atarantados,
comendo notícias da mão da polícia, de promotores e de especialistas, sem que se evidencie nenhum moto próprio de investigação por parte da mídia, ainda
que dentro de seus limites.
Tal comportamento, quase
passivo, não condiz com um
princípio básico do jornalismo:
notícia decisiva não cai do céu;
redunda, ao contrário, de abrir
caminhos e avançar por eles até
tocar na versão mais próxima
possível da verdade.
Se isso vale de um modo geral,
que dirá num caso tão misterioso
como o do zôo...
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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
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