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Hélio Schwartsman

O melhor restaurante

SÃO PAULO - Saiu a lista dos melhores restaurantes do planeta, com seus cardápios requintados e preços exorbitantes. É uma boa ocasião para revisar a psicologia do gosto.

O paladar é o sentido mais pobre. Nossas papilas gustativas detectam só cinco sabores: doce, salgado, azedo, amargo e umami (o gosto do molho de soja). É claro que, se fosse assim tão simples, poderíamos mimetizar qualquer iguaria apenas misturando açúcar, sal, vinagre, quinino e glutamato nas proporções certas.

Na verdade, o que chamamos de gosto é o resultado de uma interação mais complicada entre paladar e olfato. Aqui, contrariando o mito de que o homem é mau farejador, contamos com cerca de 350 tipos de receptores olfativos, que nos habilitam a distinguir mais de 10 mil cheiros.

O complexo paladar-olfato é complementado ainda pelas percepções de textura e temperatura, captadas principalmente pela língua. O resultado, porém, forma um conjunto ainda muito incompleto, e o cérebro preenche as lacunas de modo às vezes embaraçoso para os gastrônomos.

Os exemplos mais vexatórios vêm da cultura enológica. Diversos trabalhos mostram que mesmo especialistas têm dificuldades para distinguir um vinho branco de um tinto e que a mesma bebida fica muito mais gostosa quando se diz ao provador que ela custa US$ 90 do que quando o preço informado é de US$ 10. Essa inconsistência na percepção dos sabores não está restrita aos líquidos. Já foi demonstrado que podemos nos deleitar com comida de cachorro como se fosse patê de "foie gras".

Na melhor tradição proustiana, o cérebro humano se deixa induzir por memórias e expectativas. A sua sobremesa favorita da infância é gostosa não só porque estamos darwinianamente programados para perseguir calorias, mas também porque ela evoca boas lembranças.

É o contexto que produz o gosto. Para sermos rigorosos, o melhor restaurante está em nossas cabeças.

helio@uol.com.br

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