São Paulo, Sábado, 01 de Maio de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

É tempo de conversão

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

A vida nova que Jesus Cristo ressuscitado nos comunica inclui sempre o esforço de nossa parte para vencer o pecado e cumprir o mandamento do amor.
Há dois desafios que todos temos que enfrentar em busca de uma convivência fraterna. Trata-se do ambiente cada vez mais violento em que vivemos e da insensibilidade diante das desigualdades e das injustiças sociais.
Com efeito, nosso povo sofre o aumento cotidiano da violência exacerbada pelos programas de televisão. Basta verificar o número de assaltos, sequestros, conflitos de quadrilhas e o tiroteio perdido nas madrugadas. A população sente-se insegura. Infelizmente, a violência penetra entre os jovens. Quem não se apavora com a insanidade do assassinato brutal dos alunos na escola de Littleton, no Colorado? Entre nós, permanece a dor diante da maldade perpetrada por jovens contra o índio Galdino. Nos campos de futebol, os torcedores se agridem.
Continuam as execuções sumárias e impunes por parte da polícia. Cadeias e delegacias são cenários de maus tratos, torturas e lutas internas que não raro terminam em morte. Acrescentemos o abuso sexual das crianças, a prostituição juvenil e toda violência cometida no lar, fruto muitas vezes do álcool e do uso das drogas.
O segundo desafio para todos é a apatia e a omissão diante da miséria, fruto das injustiças sociais. A falta é maior nas comunidades cristãs por causa do preceito da caridade, prioritário para os discípulos de Jesus.
A consciência fica ofuscada. Não percebe mais o sofrimento do desemprego, da fome e das enfermidades que pesa sobre o próximo. O egoísmo, aliado à acumulação doentia de bens na classe mais abastada e à cultura do consumismo que pervade a classe média, impede a percepção da extrema pobreza de milhões de irmãos.
Como redescobrir e respeitar a dignidade de toda pessoa? Como firmar as pilastras da nova sociedade sem violência e marcada pela solidariedade fraterna?
É necessário reconhecer que o enfraquecimento da fé em Deus leva, aos poucos, a perder o horizonte da transcendência, a supervalorizar o próprio eu e a considerar os demais seres humanos como objetos descartáveis. Se nem sempre se descamba numa agressão direta ao semelhante, vai-se contudo abandonando o referencial ético. Segue-se a desorientação nos julgamentos morais em relação ao valor da pessoa humana no seio materno, nas questões de eutanásia e ainda nas graves manipulações genéticas, como se tudo o que é cientificamente possível fosse eticamente permitido.
A sociedade que elimina sem escrúpulos pelo aborto uma criança inocente e indefesa também é capaz de apoiar chacinas, ações de limpeza étnica e bombardeios intimidadores.
A conversão que o Evangelho proclama faz-nos voltar o coração para Deus e descobrir o valor da vida humana por Ele amada e criada.
Esse valor ganha em intensidade à luz da entrega de Cristo à morte para nos resgatar do pecado e oferecer a salvação a cada pessoa humana.
Quem ama a Deus aprende a respeitar e a promover a vida dos que são filhos seus e irmãos nossos. É isto que há de pôr freio a toda violência e tornar possível a partilha fraterna e a edificação da sociedade solidária.


D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Velhos papéis
Próximo Texto: Frases

Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.