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TENDÊNCIAS/DEBATES
Uma semana pela vida
FERNANDO LEÇA
Desde que o homem se reúne em
sociedade, grupos ou comunidades, a solidariedade, em maior ou menor grau, vem sendo praticada. Por um
bom tempo, no entanto, as pessoas que
se dedicam a atividades de ajuda a pessoas mais necessitadas foram classificadas como "assistencialistas".
Por um viés, dito liberal, proclamava-se que era preciso "ensinar a pescar em
vez de dar o peixe". E a tarefa de ensinar
seria uma obrigação do Estado. Os autores de tais assertivas eximiam-se, assim, de responsabilidades sociais com
os mais necessitados. Como se essa responsabilidade estivesse relacionada a
atitudes como dar uma esmola. Esses
conceitos, ainda bem, passaram por
uma grande transformação.
Hoje em dia, mais e mais pessoas, empresas e órgãos públicos têm assumido
a responsabilidade sobre uma chaga
que afeta um grande número de pessoas, principalmente nos países do Terceiro Mundo. A exclusão social é uma
tragédia que, às vezes, atinge até aqueles
que sabem ou souberam pescar. Idosos
e adultos são abandonadas à própria
sorte e são abatidos por aquilo que os
pesquisadores e sociólogos chamam de
desalento.
Por paradoxal que pareça, a exclusão
social aumenta ainda mais com as ferramentas introduzidas pela globalização.
Novas tecnologias alijam do mercado e
do convívio social seres humanos que
até bem pouco tempo poderiam estar
engajados em atividades sociais e produtivas. E o Estado, por mais poderoso
que possa parecer, não consegue cuidar
de todos eles.
A forma de encarar a atividade solidária voluntária começou a mudar no Brasil graças à intervenção de um sociólogo, oriundo dos quadros da esquerda.
Antes de morrer, vitimado pelo vírus
HIV contraído em uma transfusão de
sangue, Herbert de Souza, o Betinho,
construiu uma rede de entidades que se
dedicam justamente a ajudar os mais
necessitados, as vítimas da pobreza, da
fome e da exclusão social.
Para lembrar a memória e o trabalho
de Betinho, o Coep (Comitê de Entidades no Combate à Fome e Pela Vida),
por ele fundado em 1993, decidiu organizar a Semana de Mobilização Nacional pela Vida. Em São Paulo, a programação acontece de 4 a 9 de agosto e terá
como tema "A Globalização Solidária: a
valorização da vida na cidade de São
Paulo".
É possível integrar os excluídos em projetos de participação que ofereçam o peixe e que também ensinem a pescar
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A abertura será no parque da Água
Branca, com a apresentação do grupo
de percussão Zunidos do Monte Azul e
da Orquestra Filarmônica Brasileira do
Humanismo Ikeda. E o encerramento
será no Teatro São Pedro, com a apresentação do balé de dança contemporânea da cidade de Ribeirão Preto Cia.
Distrito da Dança e um tributo a Betinho, no dia 9 de agosto, quando se completam cinco anos da sua morte.
Ao longo da semana haverá debates,
eventos e intervenções culturais em teatros e espaços públicos da cidade de São
Paulo. Serão também anunciadas importantes parcerias do Coep com entidades como o Sebrae (Serviço Brasileiro
de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e a Associação Brasil Soka Gakkai
Internacional, que propaga os ideais
humanísticos da paz, da cultura e da
educação.
Ao todo, mais de 700 entidades participarão de ações e atividades em busca
de soluções para resgatar a dignidade
humana. Uma prática que, aliás, já vem
sendo exercida por uma série de empresas e organizações.
A globalização, todos nós sabemos,
produz tanto a riqueza quanto a miséria. Mas é possível integrar os excluídos
em projetos de participação que ofereçam o peixe e que também ensinem a
pescar. Pois, como diria Caetano Veloso, "gente foi feita para brilhar, e não para passar fome". E, segundo Joãosinho
Trinta, "quem gosta de pobreza é intelectual".
Por isso convidamos todos os brasileiros a participarem não só da Semana de
Mobilização Nacional Pela Vida, pois
nela será possível conhecer projetos que
poderão significar uma nova opção de
vida.
Fernando Leça, 61, advogado, é secretário do
Emprego e Relações do Trabalho do Estado de
São Paulo e presidente do Coep.
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