São Paulo, quinta-feira, 02 de maio de 2002 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES A força do direito versus o direito da força
FLAVIA PIOVESAN
O Estatuto de Roma aplica-se igualmente a todas as pessoas, sem distinção nenhuma baseada em cargo oficial. Ou seja, o cargo oficial de uma pessoa, seja ela chefe de Estado ou de governo, não eximirá sua responsabilidade penal nem importará em redução de pena; o que é um grande avanço do estatuto com relação ao regime das imunidades. No contexto posterior a 11 de setembro, com a gravíssima crise do Oriente Médio, o combate ao terrorismo converte-se na preocupação central da agenda internacional, vocacionada à garantia da segurança máxima, na atuação do chamado "Estado-polícia". O maior desafio contemporâneo, como afirma o professor Paulo Sérgio Pinheiro, é evitar a Neo-Guerra Fria, que tende a conduzir ao perigoso "retorno às polaridades, definidas pelas noções de terrorismo e pelos métodos para combatê-lo" (Folha, pág. A3, 31/3/02). O risco é que a luta contra o terror comprometa o aparato civilizatório de direitos, liberdades e garantias, sob o clamor de segurança máxima. Contra o risco do terrorismo de Estado e do enfrentamento do terror, com instrumentos do próprio terror, só resta uma via -a via construtiva de consolidação dos delineamentos de um "Estado de Direito" no plano internacional. Para este Estado, é essencial o primado da legalidade e uma Justiça preestabelecida, permanente e independente, capaz de assegurar direitos e combater a impunidade, especialmente a dos mais graves crimes internacionais. O Tribunal Penal Internacional é capaz de reduzir o "darwinismo" no campo das relações internacionais, em que Estados fortes, com elevado poder discricionário, atuam como bem querem em face de Estados fracos -basta mencionar a oposição dos EUA à criação do tribunal, temendo que americanos sejam processados por crimes de guerra, quando do uso arbitrário da força em território de Estado-parte do estatuto. O tribunal também limita o grau de seletividade política no caso da responsabilização criminal em violações de direitos humanos. Basta acenar que a criação de recentes tribunais "ad hoc" basearam-se em resoluções do Conselho de Segurança, para as quais é necessário o consenso dos cinco membros permanentes, com poder de veto. Ao adotar o princípio da universalidade, o estatuto aplica-se a todos os Estados-partes, que são iguais no Tribunal Penal. O Tribunal Penal Internacional celebra, sobretudo, a esperança de que a força do direito possa prevalecer em detrimento do direito da força. Flavia Piovesan, 33, professora doutora em direito do Programa de Pós-Graduação da PUC-SP, é procuradora do Estado de São Paulo e membro do Conselho Nacional de Defesa da Pessoa Humana e da Comissão Justiça e Paz. Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Roberto Romano: Fascismo e pecados sexuais Próximo Texto: Painel do Leitor Índice |
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