São Paulo, segunda-feira, 02 de maio de 2005

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JOÃO SAYAD

Mistério chinês

A China financia o excesso de consumo americano. Não deixa a sua moeda se desvalorizar. Acumulou reservas de US$ 500 bilhões. Promete investir parte das reservas no Brasil e na Argentina. Importa soja, outros produtos agrícolas e aço, cujos preços internacionais aumentaram, para a alegria de todos os países da América Latina. Embora concorra com a indústria têxtil da América Central e com as maquiladoras do México.
É a grande novidade da economia mundial dos últimos dez anos. Exporta produtos que usam mão-de-obra barata e produtos de alta tecnologia. Poupa muito. E recebe grandes volumes de investimento direto do estrangeiro.
Há várias formas de contar uma história. Para crianças, a Chapeuzinho Vermelho. Para a história econômica, o Oriente é escolhido muitas vezes como protagonista principal: a Idade Média se inicia quando o islã domina o Mediterrâneo e fecha o comércio com o Oriente. O renascimento comercial começa na Europa, com as viagens de Marco Polo à China. A América e o Brasil foram descobertos quando portugueses e espanhóis procuravam caminho para a Índia depois que Constantinopla caiu na mão dos otomanos. Em 1974, os árabes aumentaram o preço do petróleo.
O que aprender do sucesso da China? Há quem viaje para longe, atravesse a linha internacional do dia seguinte apenas para descobrir que não há nada de novo no fim do mundo .
Conclui que a China está crescendo porque poupa muito (como o médico que explica que um cliente está engordando porque come muito. Por que come muito?). Que cresce porque exporta. Por que exporta? Que exporta porque a mão-de-obra é barata. Mas por que é barata? Que recebe investimentos diretos porque tem um ambiente de negócios favorável. Apesar de falarem chinês. Apesar de a lei chinesa não ser nem a "common law" anglo-saxônica nem o direito romano. Apesar de o governo ser acusado de práticas pouco democráticas. E apesar de ser um país comunista.
O sucesso da China pode ser contado de outra forma. O desenvolvimento chinês decorre da perspectiva de crescimento do mercado interno e da inclusão de um imenso número de chineses na economia capitalista. Os investimentos diretos vão à China porque a mão-de-obra é barata, porque é disciplinada. Mas também porque há um imenso número de chineses que será integrado ao mercado. O projeto de desenvolvimento chinês é projeto nacional (não nacionalista) -transformar a China em nação próspera e rica. É nacional ou público porque interessa e beneficia mais os chineses todos -o público- do que os chineses ricos ou os chineses desempregados que procuram trabalho.
Finalmente, a China mostra que desenvolvimento é um processo de desequilíbrio, círculo virtuoso nem estável, nem bem comportado.
Não adianta ir à China e se hospedar no hotel que serve "caesar salad" e bife com fritas. Quem viaja com as teorias de sempre na mala não aprende nada sobre o lugar para onde foi nem sobre o lugar de onde veio.


João Sayad escreve às segundas-feiras nesta coluna.
@ - jsayad@attglobal.net


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