São Paulo, segunda-feira, 02 de maio de 2005

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O item cor/raça no Censo Escolar

ELIEZER PACHECO

O Inep tem o compromisso social de buscar informações para subsidiar a formulação de políticas na área da educação. Uma de suas atribuições é elaborar diagnósticos e recomendações decorrentes da avaliação da educação básica, por meio do desenvolvimento e implementação, na área educacional, de sistemas de informação e documentação que abrangem estatísticas, avaliações, práticas pedagógicas e de gestão das políticas educacionais. Esses dados orientam as ações dos gestores públicos da educação no Brasil e, quanto mais precisos, melhor para a sociedade brasileira como um todo.
Desde sua fundação, no ano de 1937, o Inep vem cumprindo essas suas históricas finalidades, o que faz dessa autarquia a mais importante fonte de dados educacionais em nosso país. Cumprindo sua vocação, a cada ano o Inep agrega a seus produtos, tais como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), o Censo da Educação Superior e o Censo Escolar, questões importantes que ajudam o brasileiro a se conhecer em profundidade cada vez maior. É o caso da inclusão, em 2005, do item cor/ raça no Censo Escolar.
Surpreende, no entanto, que tal fato venha causando polêmica nas páginas de Opinião da Folha. Por que o Ministério da Educação poderia perguntar sobre diversos dados socioeconômicos dessa população, tais como necessidades educacionais especiais, transporte escolar e merenda, mas não poderia procurar saber a cor/raça dos brasileiros que estão na educação básica? É preciso lembrar que esses dados não são coletados por nenhuma outra pesquisa em nosso país, embora sejam fundamentais para nortear políticas em nível federal, estadual e municipal.
Que motivações haveria por baixo da recusa em buscar conhecer a distribuição de brancos, pretos, amarelos e pardos na escola brasileira? Que argumento poderia ser mais forte do que a necessidade de esclarecimento, de precisão de dados e de clareza de informação sobre a realidade dessa população? Que motivo haveria para ocultar da sociedade brasileira uma informação importante como essa, silenciando a pergunta aos alunos de nosso país? Aparentemente, nenhum. E, afinal, é preciso dizer que, com base na coleta do dado cor/raça -até hoje desconhecido-, os gestores de educação do país poderão definir ações e políticas afirmativas e de promoção da igualdade na comunidade escolar.


Os técnicos do Inep tiveram o cuidado de ouvir grupos de movimentos sociais ligados à questão racial no Brasil

Além do mais, o processo de inclusão desse item ocorreu de maneira completamente democrática. No ano passado, visando à inclusão do item cor/raça no Censo Escolar 2005, o Inep organizou seminários para discutir e explicar como seria a coleta nas unidades escolares. Participaram desses encontros representantes de secretarias estaduais e municipais de Educação. A orientação era para que, a partir de 2005, as fichas de matrícula de escolas de educação básica contivessem espaços para a indicação autodeclarada da cor do aluno. Quem tivesse 16 anos ou mais declararia sua raça/cor e, quanto aos mais novos, os pais ou responsáveis responderiam. Para escolher os termos de classificação de raça ou cor, os técnicos do Inep tiveram o cuidado de ouvir grupos de movimentos sociais ligados à questão racial no Brasil.
Foram consultados também representantes da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. Encerradas as discussões, a equipe do Inep optou por seguir os critérios adotados pelo IBGE, que desde o censo de 2000 utiliza, nas pesquisas sobre cor e raça da população brasileira, os termos amarela, branca, indígena, parda ou preta. Segundo os critérios do instituto, o quesito é denominado de "cor ou raça", e não apenas de "cor" ou apenas de "raça", porque as categorias que engloba podem ser entendidas pelo entrevistado de forma bastante diversa.
Quem responde "branca" não necessariamente está entendendo a qualificação como uma categoria de sua "raça", assim como quem responde "preta" -que, por definição, trata-se de uma categoria de "cor"- pode estar, no seu entendimento, respondendo a um atributo de sua "raça" ou origem racial, o que torna o assunto complexo. Ou seja, como a questão envolve elementos de atribuição de identidade e percepção, não se pode controlar objetivamente o que cada categoria representa subjetivamente para cada entrevistado -o que traz reflexos em sua resposta.
Todas essas precauções foram tomadas a fim de que a coleta do dado cor/raça viesse qualificar ainda mais o universo de informações de que pesquisadores, educadores e gestores públicos já dispõem. Conhecer o Brasil é bom para a democracia e um direito de todos os brasileiros, que o governo federal não pode se furtar de garantir.

Eliezer Pacheco, professor titular de história da Universidade do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, é presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC).
@ - eliezer.pacheco@inep.gov.br


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