São Paulo, sábado, 2 de agosto de 1997.



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O governo deve alterar a atual política cambial?
NÃO
Apesar dos entraves

ROBERTO NICOLAU JEHA

O governo não deve nem pode alterar a sua política cambial. Na verdade, foi ela que possibilitou e continua tornando possível, apesar dos erros cometidos no seu início, a vitória sobre a inflação nestes três anos de Plano Real, grande trunfo do governo e grande base de sua sustentação política. É um feito, em um país que esteve anos à beira da hiperinflação, que não pode ser subestimado.
Os benefícios daí decorrentes, especialmente à população de baixa renda, foram enormes. Milhões de novos consumidores foram incorporados ao mercado, e qualquer pessoa de bom senso não aceita de volta a inflação.
Ao mesmo tempo, começa a ficar claro para a sociedade que a estabilidade é necessária, mas não suficiente. As pressões sociais e econômicas são enormes e vêm de todos os lados.
O desemprego aumenta a cada dia, e o crescimento econômico é medíocre. A indústria, setor a que pertenço, tem pagado um alto preço por essa conquista, não só em virtude do câmbio valorizado, mas também por causa de uma abertura da economia feita de uma maneira não planejada, sem um projeto de política industrial que a insira de maneira autônoma no mundo globalizado. Além disso, enfrenta sufocante carga tributária e paga os mais altos juros do mundo.
Assim sendo, o desafio agora é como, mantendo a estabilidade, voltar a crescer de uma maneira sustentada, com taxas bem maiores que as atuais, condição necessária para criarmos os novos empregos de que tanto necessitamos para diminuir a nossa grande exclusão social.
Estou convencido de que isso só será possível quando a vitória definitiva sobre a inflação não depender apenas de câmbio baixo e juros altos, mas sim de um efetivo ajuste fiscal, que ponha em ordem as contas públicas brasileiras.
Para que isso deixe de ser uma miragem distante, são imprescindíveis as grandes reformas do Estado: a política, a tributária, a administrativa e a previdenciária.
Enquanto esse objetivo essencial não for conseguido, e ficar empoçado nas tortuosas vielas fisiológicas do Congresso Nacional, resta-nos apenas a alternativa de pelo menos manter sob controle a inflação. Além da atual política de câmbio, apesar de todos os entraves que cria ao crescimento da economia e principalmente ao das exportações, sinceramente, não consigo ver uma melhor.
Feitas as reformas, efetuadas as privatizações, saneadas as contas públicas, restabelecida a capacidade do Estado de voltar a investir onde deve, estará aberto o espaço de crescimento com estabilidade, que não dependerá mais da âncora cambial. Porém mexer nela agora seria jogar fora todo o resultado conseguido e voltarmos à terrível situação de indexação cambial, com inflação e sem crescimento, que tão bem conhecemos.
Roberto Nicolau Jeha, 59, industrial, é diretor-presidente da Indústria de Papel e Papelão São Roberto S/A.




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