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São Paulo, domingo, 02 de novembro de 2003

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VINICIUS TORRES FREIRE

O bem-amado e a esperança

SÃO PAULO - Jamais tantos brasileiros confiaram tanto em um presidente que elegeram como confiam em Lula. Na democracia, jamais avaliaram tão bem um governo e um presidente, jamais foram tão otimistas com a economia e com seu próprio futuro como fazem sob Lula. É o que se depreende, não sem algum espanto, de uma leitura honesta da mais recente pesquisa Datafolha.
Talvez sob Getúlio Vargas tenha havido maior encanto pelo carisma de um presidente. Mas então apenas 26% dos brasileiros votavam, contra os 70% de agora. Talvez tenha havido momentos de grande e evidente euforia econômica, como no auge da ditadura militar, quando o país crescia 10% ao ano, ou na grande grande ilusão do Plano Cruzado.
Mas não houve caso de sucesso de imagem como o de Lula desde que a democracia começou de fato no país, em 1988. Apenas o governo FHC, entre 1996 e 1997, mereceu quase tanta estima com o de Lula. Mas, sob Itamar/FHC, a economia crescera uns 20%. A inflação caíra do milhar para a dezena. Havia empregos.
A expectativa de que Lula vá cumprir suas promessas continua tão grande como no início do mandato. Lula governa melhor que FHC para 71% dos eleitores. Mesmo os mais ricos e instruídos, os mais críticos, gostam mais do governo petista que dos tucanos em sua melhor fase.
O maior sucesso de Lula foi controlar a inflação, o que faz diferença para os mais pobres. Passou a sensação de desastre do fim da era FHC. Ainda assim, o que faz ricos e pobres, instruídos ou não, capital e interior avaliarem o governo tão bem? Esperança? A esperança é um tipo de alienação. Projeta-se num símbolo a ânsia por dias melhores.
Apesar das críticas (que, na maioria, circulam entre a mínima elite que lê jornais), Lula parece estocar enorme massa de esperança dos cidadãos de várias classes. Trata-se de um sentimento embebido da forma mais instável e inflamável de atitude política, a fascinação pelo carisma. O que será do governo quando (e se?) o dom divino de Lula cair na real, ou diante da realidade?



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