São Paulo, terça-feira, 02 de novembro de 2004 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Ante os olhos da cabra cega
OLAVO DE CARVALHO
O Brasil é hoje, entre as nações, talvez a mais obediente a esse esquema. De uns anos para cá, nossas leis, nossos planos econômicos, nossos programas de educação, nosso sistema de saúde, nossas políticas de defesa, nossos padrões de julgamento moral -ou suas traduções práticas respectivas: a criminalidade incontrolável, a pobreza invencível, a incultura prodigiosa dos nossos estudantes, a falência de nossos hospitais, o desmantelamento de nossas Forças Armadas, a imoralidade transbordante-, tudo vem pronto em receitas da burocracia internacional, despejadas sobre o nosso governo como decretos divinos. Nós tudo aceitamos sem discussão, com docilidade beócia, ao mesmo tempo em que voltamos nosso ódio contra os alvos apontados à nossa execração pela mesma divindade. Maldizendo americanos e israelenses, batemos no peito com arroubos de ufanismo nacionalista no instante mesmo em que rastejamos de subserviência ante os novos donos do mundo. É patético. É quase inacreditável. Se eu não estivesse vendo com meus próprios olhos, custaria a crer que um povo pudesse, em tão pouco tempo, ser induzido a um estado de inconsciência tão geral e profundo. Embriagado pelas artes publicitárias de um delinqüente chinfrim, esse povo votou em massa num partido mafioso por acreditá-lo a epítome das virtudes morais e teologais. Poucos meses depois, desiludido com os santarrões, acredita ter se livrado deles pelo simples fato de eleger candidatos de outros partidos de esquerda, sem saber que, comprometidos por alianças no quadro do foro de São Paulo ou no mínimo pelo parentesco ideológico, esses partidos, no poder, jamais ousarão fazer nenhum dano substantivo à máquina de dominação petista. Alienado, estonteado, feito de cabra-cega, mantido na total ignorância da situação pela tagarelice uniforme da mídia, dos intelectuais ativistas e do "beautiful people" teatral e cinematográfico, não há mentira em que esse povo não creia, não há tolice desastrosa em que não aposte a bolsa, a vida, a alma e o futuro. Se pudesse, ele faria a asneira final: votaria em John Kerry, cantando vitória contra o imperialismo no ato mesmo de dar o pescoço à coleira global. Se algo a comparação das campanhas eleitorais nos EUA e no Brasil ensina, é que o poder da propaganda enganosa tem limites quando confrontado com uma autêntica variedade de fontes de informação, mas é invencível quando exercido sobre um povo inculto, deixado à mercê de uma pequena elite falante vaidosa, manipuladora e convicta de sua própria infalibilidade. Lá, a informação sobre o imperialismo global da ONU é abundante, ao menos em livros, na imprensa nanica e em programas de rádio. Aqui, é o silêncio total, confrontado com a onipresença ruidosa da propaganda antiamericana e anti-Bush. Lá, a superioridade financeira da campanha Kerry não produziu senão resultados medíocres. Metade do eleitorado americano sabe quem é e para quem trabalha John Kerry. A totalidade da população brasileira não o sabe e, por isso, torce por ele. Mas como esperar que ela veja claro o problema dos americanos, se há anos não enxerga os seus próprios? Eis onde há informações básicas: www.frontpagemag.com/Articles/ReadArticle.asp?ID=15755; www.wnd.com/news/article.asp?ARTICLE-ID=41194; www.aim.org/aim-column/2071-0-3-0-C/; http://iraqthemodel.blogspot.com/; www.renewamerica.us/columns/voigt/041004; www.stolenhonor.com Olavo de Carvalho, 57, jornalista e ensaísta, é autor de, entre outros livros, "O Jardim das Aflições" (É Realizações, 2001). Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Boaventura de Sousa Santos: Um alerta perturbador Índice |
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