São Paulo, quinta-feira, 03 de fevereiro de 2011

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CLÓVIS ROSSI

O espírito de 1776

PARIS - Os graves incidentes de ontem no Cairo não mudam o essencial: a revolução em curso no mundo árabe ou, ao menos, na Tunísia e no Egito é profundamente ocidental na alma.
Ou, como prefere Nicholas Kristof ("New York Times"), escrevendo da praça Tahrir, hoje mundialmente famosa, o movimento egípcio fala "a linguagem de 1776", o ano da independência norte-americana, seminal na história da democracia (o que se fez depois com ela é outra história).
Não se queimaram bandeiras de Israel e dos Estados Unidos, o que tira o conflito Israel/palestinos do foco de uma revolta árabe, talvez pela primeira vez na história. Mesmo quando se sabe que as cápsulas de gás lacrimogêneo disparadas pela polícia contra os manifestante traziam a inscrição "made in USA", o movimento não gritou "Yankees, go home".
Ao contrário, pedem que os ianques os apoiem e abandonem o ditador Mubarak de uma boa vez. Fazem questão de usar slogans em inglês, para que as TVs os filmem e o público ocidental os entenda.
De alguma maneira, e guardadas as imensas diferenças geográficas, históricas, culturais etc., é a reprodução do levante húngaro contra o comunismo de 1956 e do movimento dos alemães orientais que acabou levando à queda do Muro de Berlim, primeiro, e a do comunismo não muito depois.
Demonstra que a ideia de democracia goza de extraordinária saúde, a ponto de David Brooks, no "International Herald Tribune" de ontem, ter contabilizado mais de cem levantes democráticos nas duas últimas décadas, a queda de mais de 85 regimes autoritários e a instalação de 62 novas demo- cracias, ainda que definidas de maneira frouxa.
O Ocidente não tem o direito de desperdiçar a chance de dar conteúdo a uma ideia que é tão sua, por mais deturpada que tenha sido.

crossi@uol.com.br


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