São Paulo, segunda-feira, 03 de maio de 2004

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O caso Ellwanger

SIEGFRIED ELLWANGER

Tendo em vista uma série de informações incompletas ou distorcidas constantes do artigo "O STF e o racismo; o caso Ellwanger", de Celso Lafer ("Tendências/Debates", pág. A3, 30/3/ 04), voltadas a apresentar-me, novamente, como racista, quero fazer alguns esclarecimentos totalmente necessários aos milhares de leitores deste jornal.
A apresentação das nobres funções de Celso Lafer como ex-ministro das Relações Exteriores de Collor e FHC, além de ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio de FHC e autor de livros, chega a dar idéia de ter sido elaborada para valorizar o autor e lhe angariar credibilidade. Pois, sutilmente, deixa de citar que foi ele um dos principais responsáveis por o STF ter negado o habeas corpus que havia sido solicitado por mim. Para saber como isso foi possível e conhecer um pouco desse singular processo, cujo julgamento levou nove meses, o mais longo de toda a história do STF, quero, resumidamente, dar algumas vitais informações.
O relator do processo, ministro Moreira Alves, após exaustiva pesquisa e estudo, conforme páginas 524 a 545 do acórdão, concedeu o habeas corpus a meu favor. O ministro Maurício Corrêa, presidente do STF, pediu vistas do processo. Surpreendentemente, o sr. presidente, em vez de deter-se no processo, foi pedir ao rabino Henry Sobel um parecer a respeito do assunto. Vale citar que, do primeiro voto até o final do processo, o auditório do STF estava quase sempre lotado de sionistas de vários Estados (quero esclarecer que, conforme o próprio rabino diz, "todo judeu é sionista", e sionismo é o racista movimento político judaico, cujo radicalismo é condenado nos cinco continentes).
Necessito também esclarecer que o rabino é inimigo pessoal meu, pois foi testemunha de acusação contra mim em processo julgado em São Paulo. Como não podia deixar de ser, Sobel teve como assessores vários advogados, entre os quais Décio Milnitzki, Blikstein, Ramagem e, naturalmente, o supremo titular do direito da USP, Celso Lafer -todos sionistas. Também participou do encomendado "parecer" o sr. Miguel Reale, que, segundo informação recebida, é o presidente da Fundação Bunge (antiga Bunge & Born, um dos maiores monopólios de cereal do mundo). Os pesos-pesados inimigos, encomendados pelo presidente do STF, devem ter feito um trabalho de mestre, ao qual o ministro Corrêa se agarrou com unhas e dentes para negar o habeas corpus.


Propositada e falsamente, confundem meu anti-sionismo com anti-semitismo e com racismo

Em seguida ao voto do presidente do Supremo, o ministro Moreira Alves justificou novamente seu claro voto a favor do habeas corpus e pediu a palavra para acusar o presidente Corrêa de ter copiado o parecer de Lafer. Portanto Lafer, ao elogiar como lúcida a atuação do atual presidente do STF, está elogiando a si próprio! Seguiu-se violenta discussão, concluída após Moreira Alves dizer que o ministro Corrêa estava tratando do caso como se o tribunal fosse uma casa de vaidades, sendo então a sessão interrompida por não menos de duas horas.
É inegável, pois, a grandiosa participação no processo de Celso Lafer, que, modestamente, dá todos os créditos aos ministros que votaram contra mim. O ministro Moreira Alves deixou muito claro, nas folhas 594 a 611 do acórdão, que esse parecer, não solicitado por ele, relator do processo, na realidade funcionou como assistente de acusação.
Os seguintes ministros votaram por antecipação, isto é, sem pedir vistas do processo, mas citando o estranho parecer inimigo e negando o habeas corpus: Celso de Mello, Carlos Velloso, Nelson Jobim, Ellen Gracie, Cezar Peluso e Sepúlveda Pertence. O ministro Gilmar Mendes também havia pedido vistas do processo e, baseando-se e acreditando em infamantes acusações que constam dele, negou o habeas corpus.
Os ministros Carlos Britto e Marco Aurélio de Mello pediram vistas e proferiram memoráveis votos. O primeiro foi aquele que mais estudou o processo, examinou-o desde seu início, na fase policial, e leu duas vezes o próprio livro em questão -"Holocausto: Judeu ou Alemão -Nos Bastidores da Mentira do Século"-, chegando a ler trechos para os surpresos ministros, que já haviam votado antecipadamente. Ele não só concedeu o habeas corpus como me absolveu completamente, demonstrando inclusive que todos os sete livros que motivaram o processo contra mim foram editados antes da lei 8.081, que foi encomendada pela Federação Israelita do Rio Grande do Sul ao então deputado Ibsen Pinheiro, posteriormente expulso da Câmara como um dos "anões do Orçamento", por não ter conseguido explicar, entre muitas acusações, a origem de valioso apartamento adquirido à vista no bairro judaico.
Sem lei não há crime. O voto do ministro Carlos Britto, nas páginas 781 a 851 e 977 a 977, merece ser lido por todos que se interessam por Justiça.
O segundo, Marco Aurélio, conforme as páginas 857 a 924, dá uma verdadeira aula sobre democracia, liberdade de pensamento e de expressão, igualmente concedendo meu habeas corpus.
Quero explicar que a tese principal do estranho parecer encomendado indica que não existem raças humanas (brancos, aborígenes, pigmeus, amarelos, negros, pardos, vermelhos são todos iguais), segundo dados científicos revelados muito depois de meu julgamento, em 1996, quando ainda havia distinção de raças. O principal em tudo é o seguinte: se houve crime, foi exclusivamente de pesquisa e opinião, por não combinar o conteúdo de meus livros com versões conhecidas e indicadas como confirmadas e definitivas. Em nenhum momento houve incitação ao racismo. Propositada e falsamente, confundem meu anti-sionismo com anti-semitismo e racismo.
Seria importante o professor Lafer esclarecer essa diferença para os nossos futuros advogados e deixar de expelir, até em aula, seu veneno contra mim, pois, por mais que se esforce, a verdade sempre vencerá.


Siegfried Ellwanger Castan, 75, historiador e editor, é autor de "Holocausto: Judeu ou Alemão - Nos Bastidores da Mentira do Século", entre outros livros. Foi condenado por prática de racismo e teve habeas corpus negado pelo STF em julgamento encerrado em setembro de 2003.


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