São Paulo, quinta-feira, 03 de maio de 2007

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CLAUDIA ANTUNES

Contra-sensos

NINGUÉM DUVIDA da fidelidade da Arábia Saudita aos Estados Unidos, movida a interesses comuns. O veterano repórter americano Seymour Hersh contou há pouco tempo, na revista "New Yorker", que os cofres generosos do reino andam financiando grupos separatistas do Irã, numa operação encoberta por procuração de Washington.
Na Arábia Saudita as petrolíferas americanas não entram, e a estatal Aramco tem o monopólio da produção. Por essa e outras, lembra discretamente o "Wall Street Journal" em reportagem sobre as nacionalizações de Hugo Chávez no setor energético, as grandes companhias do petróleo vão continuar na Venezuela, onde, ainda que como sócias minoritárias, se manterão no ramo e faturando.
O México, em geral, não é tido como dado a desvarios econômicos. Pelo contrário, seu pragmatismo comercial recolhe elogios. Lá também a exploração petrolífera é monopólio da estatal Pemex, já há algumas décadas. Tal como a PDVSA venezuelana, a Pemex sustenta o Estado mexicano, anda enfrentando dificuldades (com poços esgotados) e tem sido acusada de ineficiência pelos defensores da abertura do mercado.
O México tem uma carga tributária muito baixa, em torno de 12% do PIB. Isso costuma ser citado como grande coisa. Lá é considerado um agravante do problema econômico pelo presidente Felipe Calderón, que tomou posse em dezembro. Calderón, um conservador, tem falado em aumentar a arrecadação e acabar com monopólios privados, que dominam da telefonia às tortilhas.
O peruano Alan García decretou moratória em seu primeiro governo, nos anos 1980, mas foi saudado com alívio quando derrotou, no ano passado, o ultranacionalista Ollanta Humala, candidato a fazer dobradinha com Chávez. García andou em peregrinação por Washington para conseguir a aprovação do Tratado de Livre Comércio assinado entre o governo Bush e seu antecessor, Alejandro Toledo.
Como fez Chávez no início do ano, García obteve na semana passada superpoderes do Congresso para legislar por 60 dias, sobre segurança e narcotráfico. Diferentemente do boliviano Evo Morales, García não quer conversa com os cocaleiros. Prometeu mão dura contra eles, assim como faz o colega colombiano Álvaro Uribe, que há anos gasta milhões do Plano Colômbia com a fumigação das plantações de folha de coca -é verdade, com resultados sofríveis.
Algumas políticas provocam censura e espanto; outras, idênticas ou quase, são tratadas como fatos da vida, produtos de circunstâncias particulares, mesmo que combinadas com autoritarismo. Depende de quem elas beneficiam. Historicamente, a coerência é fraca diante da conveniência.


CLAUDIA ANTUNES é editora de Mundo

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