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FERNANDO GABEIRA
Também fui brasileiro
HÁ UM VERSO de Drummond que diz: "Também
sou brasileiro, moreno como vocês".
Continuo moreno, mas às vezes
duvido se sou mesmo brasileiro.
Talvez pelos longos anos de exílio,
ou pela ausência de um equipamento mental adequado, o fato é
que fico perplexo no momento em
que todos parecem eufóricos.
Acho estranho que governo e
oposição briguem tanto em torno
das verbas de saúde e sejam tão
unanimemente festivos quando se
comprometem a gastar com futebol. Não condeno gastos com a Copa, apenas lamento que essa ruidosa concordância não se dê em torno de outros temas essenciais.
Mais curioso ainda é o deslocamento de governadores para Zurique. Será que nenhum deles tinha
algo mais importante a fazer? Em
outras palavras: nenhum deles teve
a coragem de dizer aos seus eleitores que a viagem, em termos de
custo-benefício, não compensava?
Com tantos aspones, marqueteiros e puxa-sacos, certamente pesaram seus passos e acharam que
sim, compensava, em termos eleitorais, participar da caravana internacional. Sempre nos acusam
de espírito de vira-latas quando
criticamos esse espalhafato. Mas
não seria espírito de vira-lata toda
essa ansiedade e oba-oba quando
somos candidatos únicos? E essa
história de escritores com metáforas duvidosas, essa mania de aplaudir entrevista coletiva, como fizeram como a de Ricardo Teixeira?
Será que os aspones acham que impressionam os repórteres?
Teixeira usou na entrevista um
recurso, momentaneamente, típico no Brasil. Questionado sobre a
violência, afirmou que ela existe
também nos EUA e na Inglaterra.
Tirem EUA e Inglaterra e coloquem "governo passado" e terão a
fórmula mágica.
Pior que, na caravana, estavam
governo presente, passado e, possivelmente, futuro.
Lembro-me de que, quando jovem repórter, fiz, numa coletiva
em Portugal, pergunta sobre a ambigüidade brasileira na ONU em
relação à independência dos países
africanos. O então chanceler Juracy Magalhães respondeu irritado: como é possível torcer contra o
Brasil? Considerava as dúvidas como antibrasileiras.
Quando todos celebravam,
amargava minhas dúvidas, não sobre a Copa, mas sobre essa trajetória de provincianos ruidosos em
Zurique. Entre aplaudir a entrevista de Ricardo Teixeira e vaiar até
minuto de silêncio, há margem de
manobra. Continuarei vaiando os
governos do passado, do presente e
do futuro próximo. Certamente
vão perguntar: como é possível torcer contra o Brasil? De certa forma,
é minha especialidade. Se ser brasileiro é isso, não contem comigo.
assessoria gabeira.com.br
FERNANDO GABEIRA escreve aos sábados nesta
coluna.
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