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TENDÊNCIAS/DEBATES
O Brasil tem condições de sediar a Copa de 2014?
SIM
Preparação e superação dos problemas
MAURICIO MURAD
FOI O que o Brasil ouviu da Fifa.
Único concorrente, pentacampeão mundial, maior celeiro de
craques, rodízio entre continentes,
boa avaliação dos inspetores. Deu tudo certo. A Copa de 2014 será mesmo
aqui. O mais importante, agora, é saber o que vamos fazer com tudo isso.
O Brasil foi escolhido apesar da violência, da corrupção, da impunidade.
Nada disso é novo, embora alarmante. Novidade é o que podemos ganhar
com a Copa. A Fifa e seus investidores
exigem muito, mas também ajudam.
E com essa gente não tem brincadeira. Os interesses são grandes, e prazos, metas, orçamentos e compromissos têm que ser cumpridos. Assim, a
Copa é uma boa oportunidade para o
Brasil experimentar coletivamente
novos conceitos e melhores valores.
Está no caderno de exigências da
Fifa: avaliar, planejar e investir, tudo
a curto, médio e longo prazo; mapear
e controlar os problemas com ações
de inteligência e prevenção; se preparar para aproveitar ao máximo o
evento -antes, durante e depois. Afinal, é um direito e um dever ir além do
campo esportivo, agregar valores e
realizações que fiquem. Temos um
histórico de vitórias dentro de campo.
É hora de outras conquistas.
A Copa é uma chance rara de nos
obrigarmos a construir e cumprir minimamente esse plano estratégico. Os
ganhos em termos de emprego direto
e indireto, na cultura, na segurança e
em outros domínios são conhecidos.
Por isso, é bom aprender com quem
já fez. Nossos laboratórios são o Mundial de 2006, na Alemanha, e o Pan de
2007, no Rio. Pesquisas ajudam no
planejamento, na execução e na gestão do legado. Então, vamos convocar
uma pequena seleção de resultados
de pesquisa para auxiliar a avaliação.
A Copa da Alemanha foi um projeto
da sociedade e uma ajuda à inclusão e
ao desenvolvimento. Por cinco anos,
investiram em infra-estrutura, além
de campanhas mostrando o evento
como uma grande oportunidade, e o
futebol, como patrimônio cultural.
Não somos a Alemanha, mas temos
sete anos pela frente. Não é muito,
mas também não é tão pouco. É preciso começar já e estender ao máximo
os efeitos da Copa. Devemos lembrar
o que os alemães cantaram no Portão
de Brandemburgo: "A Itália ganhou
uma Copa, a Alemanha, uma alma". O
Brasil precisa ganhar uma alma e passar a limpo suas instituições.
Lá, a segurança foi prioridade, para
garantir os investimentos e a integridade das pessoas. O apoio das polícias
internacionais, tido como fundamental, seguiu o previsto: pesquisa, inteligência, prevenção, convivência. A lei
foi aplicada com autoridade.
Aqui, nosso estudo do Pan, com
2.410 homens e mulheres de diferentes idades, classes sociais e escolaridades, mostrou que, para 93%, a segurança é essencial na qualidade de vida. E 83% acharam que a segurança
foi prioridade só no papel e que dela
ficará pouco, "porque foi para gringo
ver". A experiência alemã (e não o
Pan) incorporou o que deu certo e deve ser o exemplo.
Que tal aproveitar os investimentos e a pressão internacional da Copa
para fazer da segurança uma real
prioridade? Não é porque nos falta segurança que não devemos ter a Copa;
devemos ter a Copa para ajudar a ter
segurança, entre outros aspectos.
A cooperação polícia-população, os
fundamentos educacionais do esporte, o envolvimento das escolas e uma
política para as áreas esportivas são
precondições exigidas pela Fifa e devem ficar como legado.
A pesquisa do Pan mostrou a necessidade de melhorar o transporte, o
trânsito e a iluminação das ruas. Leis
duras e ações preventivas. Integração
entre município, Estado e União em
políticas públicas e projetos sociais.
Desde 2001, a Alemanha preparou
2006. O Brasil deve solicitar -e já- a
ajuda alemã, como fez a África do Sul,
sede de 2010. Isso é um direito previsto e bem-visto pela Fifa e seus patrocinadores. Não é um favor.
A Copa de 2006 e o Pan de 2007 são
o nosso pontapé inicial. Temos que
fazer mais, organizar melhor e controlar os custos. Bilhões estarão em
jogo e sob avaliação internacional.
Nossa imagem também. Temos a
obrigação de não perder essa.
Esporte é atividade socioeducativa,
expressão de identidade, fator de socialização. Uma Copa não resolve
questões básicas, estruturais, mas pode ajudar. Depende de nós.
MAURICIO MURAD , 57, sociólogo, doutor em sociologia
do esporte, é professor da Uerj (Universidade do Estado
do Rio de Janeiro) e do mestrado da Universo. É autor, entre outras obras, de ""A Violência e o Futebol, dos Estudos Clássicos aos Dias de Hoje".
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