São Paulo, sexta-feira, 03 de dezembro de 2010

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RUY CASTRO

Meninos afobados

RIO DE JANEIRO - "Hair", o musical roqueiro que voltou a cartaz no Rio, me perseguiu durante um ano quando estreou por aqui em 1970, no velho Teatro República, defronte ao "Correio da Manhã", onde eu trabalhava. Todos os dias alguma colega de redação tentava me arrastar para assisti-lo. Mas não o vi na época e de novo não vou vê-lo.
Nada a favor ou contra os possíveis defeitos ou qualidades do espetáculo, apenas uma implicância pessoal contra a sua, digamos, "mensagem" -a de que estava chegando ao fim a Era de Peixes, responsável pelas pestes, guerras, tragédias e demais mazelas do mundo, e começando a Era de Aquário.
Seria uma era de fraternidade universal, com o equilíbrio entre a razão e a intuição. Os problemas sociais se resolveriam de forma pacífica e equitativa, e a humanidade conheceria grande desenvolvimento espiritual e intelectual. Bastava que, como dizia a letra da canção "Aquarius", a Lua chegasse à sétima casa e Júpiter se alinhasse com Marte. E, pelo que se acreditava, não ia demorar, era para já.
Confesso que, embora sem ligar muito para astrologia, mas regido desde o berço por Peixes, me ressentia do súbito desprestígio deste signo. E, talvez por fumar o careta Luiz XV, e não aquela erva que vinha do Norte, eu não fizesse muita fé nessa história de Aquário.
Bem, aconteceu que, nos anos logo seguintes a 1970, as ditaduras asfixiaram o Brasil e a América do Sul, guerras indescritíveis estouraram na África e ondas de terrorismo começaram na Europa. Mais um pouco e viriam a Aids, o vazamento de Chernobyl, várias crises econômicas mundiais e muitas outras desgraças. Se era isto que Aquário nos reservava, poderíamos ter ficado com Peixes.
Sabe-se agora que a Era de Aquário só deve começar por 2600, e olhe lá. Menos mal, ainda há esperança. Os meninos de "Hair" foram apenas um pouco afobados.


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