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JOSÉ SARNEY
O dia seguinte
Nada mais didático do que uma
boa história, melhor ainda se
protagonizada por grandes homens
em momentos extremos. Leio que
Blair e Bush determinaram às forças
que estão no Iraque que matem todos
os dirigentes do partido Baath, de Saddam, quando ocuparem cidades. Assim, os líderes e cabeças dirigentes serão eliminados. É uma maneira de tratar os vencidos. Mas não é nova. Recordo a Conferência de Teerã, na Segunda Guerra Mundial, quando, pela
primeira vez, se encontraram Stálin,
Roosevelt e Churchill. Estavam os três
a jantar quando Stálin disse: "O problema alemão pode ser resolvido encerrando e fuzilando os 50 mil mais
destacados oficiais e técnicos". Churchill, em suas "Memórias da Guerra",
relata o fato e conta sua reação: "O povo inglês e o Parlamento jamais vão
tolerar execuções em massa. Eu preferiria ser levado para o jardim aqui,
agora, e ser eu mesmo fuzilado a conspurcar minha honra e a de minha pátria numa infâmia dessas". E retirou-se da mesa.
Velhos tempos, outros homens. Podemos comparar a dimensão do grande estadista inglês com a sofreguidão
com que o atual primeiro-ministro do
Reino Unido se conduz neste momento.
Nenhum profeta poderá dizer o que
virá após a guerra do Iraque. Tudo indica que vamos entrar num período
do império da força, a voz das armas.
E armar-se no mundo atual significa
ter armas nucleares. A Coréia do Norte nos dá o primeiro exemplo. Ninguém a ameaça de invasão porque
dispõe de artefatos atômicos.
Depois do fracasso da decapitação,
será possível vermos modernas armas
nucleares, de efeito controlado e limitado, serem estreadas no Iraque. Basta
que abril seja marcado por grandes
tempestades de areia e as temperaturas se elevem a 50C, prolongando a
guerra, para que essas armas apareçam. Para justificá-las, surgirá a especulação de que a defesa de Bagdá vai
utilizar armas químicas. Putin alertou
sobre isso. Onde há fumaça, diz o ditado, há fogo.
Essas hipóteses estão na cabeça de
estrategistas especuladores, pois Bush
já mostrou que seus limites não têm limites.
Em relação ao Brasil, esse novo período crítico nos aponta três pontos
sensíveis. A Alca, que é a expansão dos
ativos intangíveis americanos, isto é, o
conhecimento competitivo de que
não dispomos, começará a negociação em clima de temor reverencial. O
perigo crescerá se Menem se tornar de
novo presidente da Argentina. Sua
campanha é realizada à base da tal "relação carnal com os EUA". O segundo
ponto será a sensível tríplice fronteira
Paraguai, Brasil e Argentina, apontada
com recato como vulnerável a refúgio
terrorista. Qualquer episódio nessa região terá intervenção imediata, com
ou sem concordância dos países lindeiros. O terceiro ponto será a Amazônia, que será área de tutela verde.
Assim, vamos nos preparar para o
após-guerra com as orelhas em pé e
um olho no padre e outro na missa.
E, para completar, ainda temos a
pneumonia de Hong Kong!
José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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