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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES
A volta da bicicleta
Nada poderia ser mais catastrófico para o Brasil se, neste início
de ano, tivesse ocorrido mais um daqueles conhecidos e nefastos ataques
especulativos. A esta altura, investidores e poupadores estariam recusando
a moeda nacional, correndo para o
dólar e gerando uma terrível desorganização econômica e social.
Felizmente vivemos o inverso disso!
Nos quatro primeiro meses, o Brasil
acumulou um superávit na balança
comercial de US$ 4 bilhões -e espera-se chegar a dezembro com US$ 16
bilhões. A dívida pública (indexada
em dólar) reduziu-se drasticamente.
A entrada colossal de dólares derrubou o seu valor de R$ 4 para menos de
R$ 3. Os preços dos combustíveis vão
baixar. A inflação tenderá a cair. Enfim, o clima é de confiança.
Por que, então, o emprego não cresce? Por uma razão muito simples. Emprego depende de investimentos em
setores produtivos. Os dólares que
aqui chegam querem apenas especular, são aplicados no curtíssimo prazo
e estão sempre preparados para sair.
Estimativas de um grande banco registram que a entrada desses capitais
nos dois primeiros meses de 2003 aumentou 80% em relação ao mesmo
período do ano passado. Eles não têm
nada a ver com os investimentos diretos que se destinam à produção. Estes
atingirão quando muito a casa dos
US$ 12 bilhões até dezembro -quando, na realidade, o Brasil precisaria de
US$ 20 bilhões.
E por que essa corrida frenética em
direção ao Brasil? Porque lá fora o ambiente ficou desfavorável para os especuladores. Quando se juntam guerra,
escândalos de balanços, quedas nas
Bolsas e juros negativos (como ocorre
nos Estados Unidos, na Europa e no
Japão), é claro que os espertalhões ficam ouriçados ao ver na sua frente um
Brasil que paga mais de 10% dos juros
reais -garantidos pelo governo e ancorados em uma política que oferece
ampla liberdade para especular, para
faturar e para embolsar.
O Brasil deu um importante primeiro passo ao afastar a desconfiança dos
jogadores do mercado financeiro.
Chegou a hora de construirmos a confiança entre os que querem ajudar o
país a expandir substancialmente a
produção e as exportações. Poderíamos estar exportando US$ 100 bilhões, US$ 120 bilhões ou até mesmo
US$ 150 bilhões por ano. Afinal, a Rússia exporta US$ 103 bilhões, a Malásia,
US$ 90 bilhões, e a Tailândia, quase
US$ 80 bilhões. Por que o Brasil, grande e diversificado, fica na casa dos US$
60 bilhões, menos de 1% das exportações mundiais?
Devagar com as comemorações. Fiquemos de olho! A euforia é mais do
mercado financeiro do que do mundo
da economia real. Isso não é bom. A
excessiva volatilidade no câmbio é favorável para quem usa o dólar como
moeda de jogo, e não como moeda de
produção.
O Brasil precisa contar com capitais
externos que entrem como parceiros,
e não como especuladores, que ficam
à espreita do primeiro espirro para
abusar das fraquezas de um doente
debilitado.
Ninguém quer proibir o livre trânsito de capitais, mas não se pode dar
asas a quem se viciou na especulação.
Abaixo as bicicletas financeiras...
Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.
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