São Paulo, quarta-feira, 04 de maio de 2005

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ANTONIO DELFIM NETTO

Aproveitar a hora

A semana passada assistiu a dois fatos da maior importância para o futuro da política econômica brasileira. Na sua forma coloquial e espontânea, o presidente Lula reafirmou a sua "crença" nas virtudes, a longo prazo, da orientação que tem sido imprimida pelo ilustre ministro Palocci. A sua defesa intransigente da política e a sua demonstração de confiança absoluta no ministro é o "garante" de sua continuidade. O segundo fato foi a irritação de toda a sociedade em relação à política de juros realizada pelo Banco Central -que nem o presidente é capaz de amenizar.
A verdade nua e crua é que, com exceção do período de transição presidencial, quando parecia que iríamos perder o controle da inflação (em novembro/dezembro de 2002, últimos meses de FHC, a inflação anualizada tinha retornado a 35%), a política monetária tem tido efeito imperceptível sobre a evolução do IPCA. Naquele período, o resultado foi brilhante: com a Selic passando de 18% para 26,3% e o superávit primário sendo elevado de 3,25% para 4,25% do PIB, a taxa de inflação anual declinou rapidamente para a sua média anual. A prova disso é que o IPCA anual médio de 7,2% (entre julho/99-outubro/02) compara-se com o IPCA médio anual de 6.8% entre outubro/03-março/05. O que houve foi um progresso na variância do índice, mostrando uma certa "convergência" construída pelo estabelecimento dos preços e das remunerações no mercado, mas não propriamente para as "metas".
É aqui que reside o problema. A defesa entusiasmada da política econômica feita pelo senhor presidente revelou que, no fundo, ele não acredita nos efeitos perversos (sem benefício visível para a taxa de inflação) sobre o crescimento do PIB e do emprego. Paradoxalmente, a ampliação do crédito aos consumidores (cooperativas, consignado, para aposentados etc.) com taxas de juros declinantes devido ao aumento da competição bancária corrigiria os efeitos procurados pela política do Banco Central, garantindo o crescimento robusto do PIB e do emprego em 2005. Se isso fosse verdade, o único prejudicado pela esquizofrenia do Banco Central seria o Tesouro, que pagaria mais juros...
Lamentavelmente, o efeito acumulado dos juros terá conseqüência sobre o nível da atividade e do emprego (porque é para isso que é feito!), e o enorme diferencial de juro real interno e externo continuará a valorizar o câmbio, prejudicando os novos investimentos em exportação. Quando isso for visível em 2006, insistirá o senhor presidente na perigosa teoria de que o "câmbio não tem importância"?
É hora, portanto, de uma mudança radical no "mix" da política econômica. Vamos 1º) cortar as despesas, reduzir o grau das vinculações orçamentárias e eliminar o déficit nominal, 2º) reduzir rapidamente os juros, produzindo uma desvalorização do real, e 3º) eliminar os impostos sobre os investimentos e acelerar a criação de zonas especiais de exportação.


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.
@ - dep.delfimnetto@camara.gov.br


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