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RICARDO YOUNG
Contraditório e democracia
Por força do fechamento da
coluna, escrevo sem saber o
resultado do pleito deste domingo. Mas as reflexões a seguir não têm a ver com o que
sair das urnas, e sim com todo o processo eleitoral deste ano.
Já disse em artigo anterior que este pleito marca a vitória da cidadania sobre os meios
tradicionais de fazer política.
Mesmo assim, senti falta do contraditório, do "jogo aberto" nestas eleições, usando a
metáfora futebolística.
Só o debate livre e desinteressado torna possível ao eleitor esclarecer qual é o melhor
programa de governo e qual é
o melhor parlamentar para legislar sobre matérias prioritárias à vida de cada um de nós.
Mas, embora tenhamos avançado, com campanhas cada vez mais caras, poucos proponentes arriscaram-se a sair do roteiro estabelecido pelos marqueteiros. Houve, isso
sim, uma inversão de valores: o marketing ditando a política, e não o contrário.
Gostaria que houvesse um
segundo turno, pois me sentiria mais seguro a respeito dos
projetos de país dos dois candidatos que chegassem a esse
estágio. Aliás, a ideia de segundo turno no Brasil surgiu
nos anos 50. Calculava-se que
seria um bom remédio para a governabilidade, evitando situações como a de JK, eleito
com 33,82% dos votos válidos.
A crise institucional que se
iniciou com ele (apesar de todos os seus feitos) desaguou
no regime militar, e só na
Constituição de 1988 adotamos o segundo turno para cargos executivos. Desde então,
houve segundo turno para presidente em três ocasiões: em 1989, em 2002 e em 2006.
Em todas as vezes, o debate
político enriqueceu-se e permitiu que o contraditório aflorasse e fosse resolvido pelo
eleitor, antes de virar crise. Por
mais aprovação popular que
um governo possa ter, a comparação de sua visão com outro projeto é sempre necessária. As contradições tornam-se mais visíveis, e as escolhas, mais seguras.
Vitórias no primeiro turno
são sempre avassaladoras, em
todos os sentidos. Ganha-se
por larga margem de votos
(50% mais um, desde que esta
soma seja maior que a dos outros candidatos), e esta grandeza tanto pode fazer com que
o eleito tenha embotado o senso de realidade como pode colocar a governabilidade do
país refém de alianças e coalizões cujos integrantes sejam
acometidos pela "hubris", conceito grego para descomedimento, confiança excessiva,
orgulho exagerado, desprezo pelo outro.
De qualquer forma, com segundo turno ou não, creio de
coração que a sociedade brasileira avançou na sua organização independente; por isso o
Brasil está melhor, e este fato me alegra muito.
Por um país cada vez mais justo, democrático e soberano, vale a pena sonhar e lutar
incansavelmente.
RICARDO YOUNG escreve às segundas-feiras nesta coluna.
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