São Paulo, terça-feira, 04 de novembro de 2008

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MARCOS NOBRE

Obama e as circunstâncias

A VELHINHA de Milwaukee e João Pereira Coutinho acreditam que John McCain vencerá as eleições de hoje nos EUA. Sem desmerecer a torcida de ninguém, junto-me ao Eremildo na certeza de que Obama será o próximo presidente.
Obama pode ser vago, mas não esconde o tamanho que pretende ter. Ainda durante a disputa pela indicação, declarou que Ronald Reagan "alterou a trajetória dos EUA de um modo que Richard Nixon não fez e de um modo que Bill Clinton não fez".
Quis dizer que um presidente é essencialmente as suas circunstâncias. Sob Ronald Reagan, afirmou, havia uma disposição das pessoas para a mudança. Ou seja: não é acaso que seu slogan de campanha seja "a mudança de que precisamos". Obama quer ser um "Reagan democrata".
Seja lá o que isso queira dizer (não parece boa coisa de qualquer forma), oportunidade não faltará. A crise econômica atual não é a de 1929, nem de longe e ainda bem.
Mas é muito grave. E, pela primeira vez em 70 anos quase ininterruptos, as duas Casas do Congresso devem ter maioria democrata. A distância histórica que separa do 1980 de Reagan é imensa. Não apenas pelo desaparecimento da União Soviética e pela revolução da informática. Todo o aparato teórico da economia que governa até hoje já tinha sido produzido e dominava a academia e instituições como o FMI e o Banco Mundial.
Para estender esse domínio também para a política faltava-lhe apenas desenvolver as técnicas de governo correspondentes. Reagan e Margareth Thatcher abriram seus governos a esse experimento. Hoje, ao contrário, não há nenhum arsenal científico e técnico alternativo à disposição. São tempos de mercado financeiro globalizado e de política econômica única.
Veja-se o exemplo dos ideólogos do mercadismo. Resolveram sumir por uns tempos, virar analistas imparciais que não têm nada com isso, reclamar da falta de moralidade dos agentes econômicos. Voltam a passar sermão assim que a crise amainar. Como se nada houvesse.
Além disso, uma mudança do tamanho que parece querer Obama é difícil por ele pertencer a uma geração emparedada entre o fantasma da "imaginação no poder" dos anos 1960 -quando nasceu- e a mentalidade "só quero saber do que pode dar certo" que guiou sua formação nos anos 1980. Em política, é uma geração (também no Brasil) marcada por poucas idéias e muito realismo político.
Talvez seu lugar na história não seja mais do que o de administrar os conflitos em fogo brando e de passar o bastão adiante. Mas pelo menos deve passar um bastão sem guerras nem obscurantismo. Não é pouca coisa.

nobre.a2@uol.com.br


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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