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ROGÉRIO GENTILE
Medo de voar
"AS COISAS são mais belas
quando vistas de cima".
A realidade nacional
desmentiu Santos Dumont. No
Brasil de Luiz Inácio e controladores de vôo sediciosos, as coisas são
mais belas quando vistas do chão,
em terra firme, e, de preferência,
bem longe dos aeroportos.
Quem consegue voar tranqüilamente hoje no país? Há seis meses
um avião lotado da Gol caiu, em última instância, porque o piloto não
foi avisado de que havia um outro
na contramão. Falha de equipamento? Falha humana? Os dois?
Ninguém sabe. O fato é que 154
pessoas morreram.
Desde então, uma série de acontecimentos contribuiu, e muito,
para agravar a sensação de insegurança dos passageiros.
Os controladores de vôo revelaram seu próprio descontrole com
os protestos que pararam o país.
Ficou evidente que trabalham
pressionados, insatisfeitos e sob
profunda tensão.
Os aeroportos mostraram seu
processo de sucateamento -Congonhas pára sempre que chove
porque a pista principal está velha
e escorregadia; Cumbica teve de
recusar pousos pelo fato de os instrumentos de auxílio ao vôo em situação de neblina terem ficado
quebrado, sem conserto, por um
mês inteiro.
Agora são os pilotos que se dizem
no limite do estresse e do cansaço,
trabalhando mais tempo que o permitido pela legislação e desconfiados das informações passadas pelos controladores. Dá mesmo para
viajar numa boa?
O pior é que quem poderia acalmar os ânimos e resolver a situação
-com bom senso, planejamento,
investimentos e, por que não, ousadia,- se mostra confuso, vacilante
e despreparado para enfrentar situações de crise.
Num dia, Lula, atropelando o
Comando da Aeronáutica, cede aos
controladores; no outro, dizendo-se apunhalado pelas costas, rasga o
acordo e cede aos militares.
Lula -que parece não saber qual
papel quer desempenhar na história, o de companheiro-mor ou o de
presidente da República- poderia,
desde outubro, data do primeiro
apagão aéreo, ter preparado o sistema para outros protestos. Não o
fez e agora diz ter sido surpreendido pelos fatos. Balela.
Governar não é apenas fazer política -um agrado aqui, um abraço
suado ali, muita intuição e estamos
conversados. Lula passou meses
debruçado sobre a reforma ministerial e conseguiu, de um modo geral, resguardando as exceções,
montar uma equipe apenas pífia.
A sorte dele, como disse o professor Marco Antonio Villa ontem na
Folha, é que o país está anestesiado. "Pode acontecer qualquer coisa
que não vai resultar em nada. O governo está protegido, blindado,
porque o país não se assusta com
mais nada."
ROGÉRIO GENTILE é editor de Cotidiano
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