|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELIANE CANTANHÊDE
Retrato brasileiro da crise
BRASÍLIA - Sacada de um irônico
amigo meu: "O retrato pronto e acabado da crise internacional do liberalismo é o Serra e a Dilma disputando em 2010". Bingo!
Ninguém aposta até onde a crise
americana vai, até que ponto a demanda por commodities de China e
Índia será afetada e em que gravidade o Brasil será atingido. Uma coisa,
porém, é certa: os símbolos do rei
mercado estão desmoronando hoje
como as estátuas de Lênin no fim da
União Soviética.
É justamente nesse clima que a
sucessão de Lula começa neste domingo a polarizar entre Serra e Dilma, velhos militantes de esquerda e
estatistas convictos, apesar de às
vezes dissimulados.
Além da fama de bons gestores e
da personalidade turrona e autoritária, Dilma e Serra têm muito em
comum: sessentões, economistas,
os dois combateram o regime militar, cada um a seu modo. Dilma aderiu à luta armada, foi presa e torturada. Serra, que presidiu a UNE, foi
obrigado a abandonar o curso de
engenharia e a exilar-se no Chile.
Com a redemocratização, eles
renderam-se à política partidária,
moldaram-se aos tempos e contorceram-se, desconfortáveis, durante
o neoliberalismo agudo. Sempre
antifinancistas. A perspectiva é de
um debate inteligente e produtivo
sobre o presente e, principalmente,
sobre os cenários futuros. Mas palanque não é só isso.
Serra tem "recall", a dianteira nas
pesquisas e traquejo político e eleitoral, mas estará às voltas com disputas comezinhas e impregnadas
de ciúme, enquanto Dilma desfilará
o país com os 80% de Lula e resultados nacionais, não apenas estaduais, mas é verde em eleições.
E o destino dos dois estará entrelaçado ao velho inimigo, o mercado.
Se a crise for controlada, melhor
para Dilma. Se descambar de vez,
lucra Serra. Se é que, evidentemente, alguém possa lucrar com uma
crise que começa no centro do sistema capitalista -por ora, sem alternativa, ou sem opositor.
elianec@uol.com.br
Texto Anterior: São Paulo - Clóvis Rossi: 2008 com olho de 2010 Próximo Texto: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Sempre uma festa Índice
|