São Paulo, sexta-feira, 06 de maio de 2011

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JOSÉ SARNEY

O diabo Bin

O mundo midiático transformou santos e diabos em uma vivência coletiva e não mais, como em outros velhos tempos, numa força individual. Logo, eles ganham corações e ódios que se espalham por toda a humanidade.
Osama bin Laden conseguiu aquilo que parecia impossível de ser conseguido: atacar o território dos Estados Unidos. O atentado às torres gêmeas, com quase 3.000 mortos, ocorreu em solo americano e despertou o medo e, mais ainda, o desejo de vingança, transformado em sentimento patriótico.
Bin Laden era, assim, a encarnação do que Bush chamou o "espírito do mal", o "diabo". Mas ele fez tudo por merecê-la. O único homem na face da terra a comunicar a todos a sua dedicação ao terror -e este como forma de vida.
Disseminou o terrorismo no mundo inteiro, incitou que a ele se dedicassem todos os revoltados, qualquer que fosse a motivação. Em seu fanatismo religioso, fazia parte do Jihad Islâmico. Se vivêssemos há dois séculos, só uma expressão lhe caberia: o diabo.
Hoje, há dúvida se o diabo existe, mas naqueles tempos ele existia e não só pregava o pecado mundial, como lutava corporalmente com o Cura d'Ars, e o santo o enfrentava com seus músculos.
Entre os problemas do futuro da humanidade está o terrorismo. O terror sempre existiu e, algumas vezes, foi uma manifestação política de grandes dimensões.
Veja-se a guilhotina da praça da Concórdia na Revolução Francesa, fazendo rolar cabeças e espalhando o pânico. O mesmo aconteceu na Rússia, na revolução de 1917, quando Lênin o proclamou como necessário à vitória e fez a apologia de sua necessidade e de seus benefícios, justificativa para exterminar opositores.
Stálin o seguiu.
A operação americana que matou Bin Laden foi cuidadosamente programada e levou meses. Washington teve a paciência de não precipitá-la e até esperou as festas do casamento do príncipe William e de Kate Middleton e a beatificação de João Paulo 2º para executá-la e executá-lo.
As preocupações com um possível culto foram pesadas: nada de fotografias, e deram-lhe o mar por sepulcro, enrolado, segundo o preceito islâmico-judaico de que o rosto do morto não pode ser visto por ninguém.
Mesmo assim, a face de Bin Laden será um ícone para seus seguidores, que terão a inspiração de sua violência e de sua impiedade. Mas o terrorismo não acabou. Vai continuar a estar presente e as nações, mobilizadas contra ele.
A Al Qaeda deixa de ter o seu chefe, mas continua pelos diabos encarnados em seus mais próximos seguidores. E um período de retaliação é esperado, porque o diabo foi morto, mas o diabo continua vivo. Hoje, como no passado.

JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.

jose-sarney@uol.com.br


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