São Paulo, quinta-feira, 06 de setembro de 2001

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A força unida do trabalho e do capital

PAULO PEREIRA DA SILVA e RAYMUNDO MAGLIANO FILHO

Com a chegada do século 21, vai ficando cada vez mais para trás o maniqueísmo que por longos anos marcou o embate político nas sociedades capitalistas e em cujo ambiente se alimentou um permanente confronto e estado de beligerância entre as forças do trabalho e do capital. Atualmente as democracias liberais em muitos países desenvolvidos apoiam-se significativamente em modelos políticos que ressaltam a cooperação entre trabalhadores e empresários capitalistas.
Essas duas grandes forças da sociedade moderna compreendem agora que são partes constitutivas de um mesmo corpo social e que podem, assim, compor ações complementares, somando esforços na busca de um mesmo objetivo: o desenvolvimento econômico sustentado, com harmonia e justiça social.
Hoje, no Brasil, empresários e trabalhadores acalentam uma aspiração comum, que é a retomada do crescimento do país. Ambos estão ansiosos para ver suas fábricas movimentarem com entusiasmo as linhas de montagem, gerando empregos, gerando renda e bem-estar para todos os trabalhadores brasileiros.
Mas esse anseio das forças produtivas da sociedade esbarra num contexto econômico adverso. Esbarra particularmente numa política econômica que não tem atribuído a merecida importância à questão da retomada da atividade produtiva. Com efeito, para fazer a produção industrial crescer de forma sustentada, seria necessário que o governo tivesse uma política estimuladora da indústria e do nível de emprego, mas isso eventualmente entra em conflito com a diretriz da atual política econômica, sempre zelosa no cumprimento de seus objetivos fiscais e monetários.
O fato é que temos hoje uma estrutura tributária que pune o investimento das empresas, que compromete uma parcela substancial de nossa produção para a exportação e que empurra grande parte das empresas e trabalhadores para a informalidade. Assim perde o país, em termos de produção, renda, emprego e também receita tributária.
Por sua vez, o mercado brasileiro de capitais, do qual se deve esperar um papel de primeira grandeza no financiamento da empresa nacional, encontra-se relegado a uma posição menor no rol das prioridades governamentais. Isso pode ser atestado pela atitude contemplativa e até fatalista com que algumas autoridades têm acompanhado o processo de definhamento do nosso mercado nesses últimos anos.


Enganam-se aqueles que não conseguem perceber um interesse legítimo do trabalhador no mercado de ações
Empresas têm fechado o seu capital ao público investidor no Brasil; grandes empresas nacionais têm dado preferência ao lançamento de ações no mercado norte-americano; os custos de transação no mercado brasileiro foram excessivamente onerados com o impacto da CPMF, tirando da nossa Bolsa de Valores as condições de competir na economia global. E o governo já prepara, para o início de 2002, a duplicação da alíquota do Imposto de Renda sobre os ganhos de capital da pessoa física em operações no mercado de ações, que deverá se elevar dos atuais 10% para 20%.
Como consequência, os negócios realizados na Bovespa vêm declinando acentuadamente, pondo em questionamento a própria solvência de uma instituição centenária e fundamental para o desenvolvimento econômico brasileiro. E as corretoras, premidas pela queda de receita, começam a considerar a conveniência de cortes de pessoal.
Foi diante desse quadro de desalento que os operadores das corretoras de valores e demais profissionais do mercado de capitais resolveram, justificadamente, se mobilizar para alertar o país sobre a gravidade da situação no mercado. E nesta mobilização os operadores contam com o apoio dos trabalhadores ligados à Força Sindical. Dada a expressividade, a combatividade e a liderança dessa central sindical no movimento dos trabalhadores, as reivindicações ganharão substancial peso político.
Enganam-se aqueles que não conseguem perceber um interesse legítimo do trabalhador no mercado de ações. Este é um preconceito ultrapassado pela evolução dos acontecimentos políticos e econômicos na maior parte do mundo. Na verdade, o trabalhador também pode desempenhar importante papel como agente poupador e, nessa condição, participar da capitalização da empresa nacional, compartilhar a propriedade da empresa com sócios capitalistas e se beneficiar da distribuição de lucros.
A enorme receptividade dos trabalhadores, aqui no Brasil, ao programa de venda de ações da Petrobras com recursos do FGTS demonstra cabalmente que o trabalhador brasileiro almeja algo mais do que apenas receber salários no final do mês. Podemos ressaltar ainda que, no caso da Petrobras, os trabalhadores tiveram ganhos de mais de 70% no investimento em ações, enquanto quem manteve o dinheiro na conta do FGTS teve rendimentos irrisórios.
Lembramos que foi uma reivindicação da Força Sindical que os trabalhadores pudessem ter acesso às ações no caso das privatizações.
É por tudo isso que a Força Sindical está na luta com os trabalhadores da Bolsa de Valores, num movimento que busca revigorar o mercado brasileiro de capitais e os empregos que estão em jogo neste processo. Estamos, mercado e trabalhadores, unidos por um mesmo objetivo: queremos crescimento, renda, emprego. Queremos também um mercado de capitais pujante, que contribua para a capitalização das nossas empresas, com geração de novos postos de trabalho, e para uma melhor distribuição da renda nacional.


Paulo Pereira da Silva, 45, é presidente da Força Sindical. Raymundo Magliano Filho, 59, é presidente da Bovespa.


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