São Paulo, segunda-feira, 06 de novembro de 2006

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Prejuízos na estufa

Estudo sobre custos do aquecimento global mostra que é mais barato gastar para estabilizar emissões de gases-estufa

FOI DIVULGADO na semana passada o primeiro grande estudo sobre os impactos econômicos do efeito estufa, o aquecimento anormal do planeta impulsionado pela queima de combustíveis fósseis. O trabalho, que recebeu elogios de importantes economistas, foi produzido por sir Nicholas Stern, chefe do Serviço Econômico do governo britânico e ex-economista-chefe do Banco Mundial (Bird).
O principal mérito do esforço de sir Nicholas, que se estende por mais de 700 páginas recheadas de gráficos e tabelas, é tentar explicitar os custos da inação, que podem ser assustadores.
São muito poucos os que ainda negam que a ação humana esteja contribuindo para elevar a temperatura da atmosfera terrestre, mas muitos ainda sustentam que tentar evitar esse efeito seria um desperdício de dinheiro. O relatório Stern prova o contrário.
Valendo-se de novas evidências científicas que mostram que o ritmo de elevação da temperatura é bem maior do que se acreditava, o trabalho chega à conclusão de que, se forem mantidos os atuais padrões de emissão de gases-estufa, a produção global deixará de aumentar em pelo menos 5% a cada ano ao longo dos próximos dois séculos em relação ao que cresceria sem o problema ambiental. No pior cenário, a perda chegaria a 20%.
Os números variam tanto porque ainda há muitas incertezas envolvidas. Uma hipótese é que o aquecimento desencadeie processos que tendem a produzir mais aquecimento. Cientistas suspeitam de que o derretimento do permafrost (o solo permanentemente congelado do Ártico) libere grandes quantidades de gás carbônico, reforçando ainda mais o efeito estufa.
Aumentos de temperatura de até 5C em relação aos níveis pré-industriais como os esperados transformariam profundamente a geografia física e humana do planeta. Seriam as populações mais pobres que sofreriam mais. O aquecimento e o conseqüente aumento do nível do mar, devido à expansão térmica do oceano e ao derretimento de geleiras de terra firme, causariam inundações que obrigariam até 100 milhões de pessoas a abandonarem regiões costeiras.
Já o custo de estabilizar as emissões nos presentes níveis -o que, supõe-se, evitaria as piores conseqüências do efeito estufa- é estimado por sir Nicholas em 1% do PIB mundial até 2050.
Em termos puramente econômicos, portanto, vale a pena nos esforçarmos agora para evitar pagar um preço muito maior no futuro. Um custo da ordem de 1% do PIB nem sequer impediria a economia mundial de continuar crescendo a taxas expressivas.
As dificuldades que frustram uma ação mais enérgica são de ordem política. Para começar, ainda há muita incerteza envolvida. Ninguém sabe ao certo o tamanho do prejuízo nem quando ele se dará. Pior, trata-se uma questão intergeracional. Ainda que nós venhamos a pagar parte do preço, a porção mais amarga da conta ficará para as gerações futuras. E, aparentemente, não se pode esperar de certos políticos que se preocupem seriamente com um problema cujas conseqüências não verão em seus mandatos nem em suas vidas.


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