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JOÃO SAYAD
Paulistas e cariocas
DEBATES DE economia são
como espetáculos de luta livre: os resultados são preestabelecidos. Na academia, seminários reúnem iguais para concluir o
que já sabiam. No mercado financeiro discutem se a taxa de juros do
final de 2007 será 12% ou 12,5%.
Existe um conflito não discutido:
dos cariocas para cima, a política
econômica é elogiada enquanto indústria e agricultura brasileiras são
criticadas. Dos cariocas para baixo,
mais o Centro-Oeste, reclamações
sobre dólar barato, juros altos e desindustrialização. Minas, conciliadora, permanece onde sempre esteve.
As teorias econômicas estaduais
são auto-explicáveis: empresários
de um lado, rentistas de outro,
igual aos tempos da Abolição. Mas
sempre é possível conversar.
Cariocas: - A taxa de câmbio
real (o preço do dólar relativamente aos demais preços da economia)
e o juro real (os 13,75% menos a taxa de inflação) não dependem do
Banco Central, que controla apenas taxas nominais. Se o dólar subir, a inflação sobe e reduz seu valor real, como na Argentina.
Paulistas: - É verdade. O BC
controla juros nominais, e não os
outros preços da economia. Assim
como o piloto de um barco, que não
tem breque (freio, diria um carioca), controla a velocidade, embora
não controle a inércia do barco,
mas consegue deslizar suavemente
até o porto. O BC tem mantido os
juros reais acima de 10% a.a. há
quatro anos, bem à frente da vice-campeã mundial, a Turquia com
5% e déficit público maior que o nosso.
Cariocas:- O dólar barato não é
resultado dos juros altos.
Paulistas:- Verdade. O dólar ficou barato na Europa, na América
Latina e na Ásia, exceção à China.
Mas o real é a moeda que mais se
valorizou na América Latina. Por
muitas razões, sendo a taxa de juros a mais importante.
Nenhum governo precisa inventar problemas. Se não fizer nada e
mantiver a redução de 0,5 ponto
dos juros a cada 45 dias, chegamos
ao fim de 2007 com juros nominais
de 9,75% e juros reais de 5,25%.
Continuamos campeões mundiais
de juros, mas economizamos 2,5%
do PIB. O déficit nominal do governo diminui para 2,5% do PIB sem
cortar despesas correntes. Podemos crescer mais do que 3%, sem
sangue ou lágrimas. É cenário fácil
e provável.
Verdade que juros e câmbio não
são o único empecilho para o crescimento, como dizem os cariocas.
São apenas os maiores, mais conhecidos e mais visíveis entre eles
-um imenso iceberg à proa. Com
juros reais de 10%, continuaremos
deslizando lentamente, até que um
tubarão engula barco, piloto medroso e todos os brasileiros.
jsayad@attglobal.net
JOÃO SAYAD escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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