São Paulo, Sexta-feira, 07 de Maio de 1999
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A rainha e a favela

LUIZ CAVERSAN


Rio de Janeiro - A rainha da Dinamarca está no Brasil. Foi a São Paulo, esteve na corte brasiliense e chegou ontem ao Rio para mais um jantar.
Hoje, a rainha repete o programa favorito de dez entre dez personalidades que visitam o Rio de Janeiro: vai a uma favela.
Não entendo essa mania de visitar favela. Fico na dúvida se a iniciativa é sempre do visitante, que considera importante para sua imagem juntar-se aos pobres nativos, ou se parte dos anfitriões, que querem mostrar que somos pobres, mas bonzinhos.
Em geral, essas visitas quase nada significam. O "circo" é armado de maneira que tudo seja rápido e sem riscos. Terminada a festinha, o que resta aos que têm de voltar à vida miserável de sempre?
Bem, tomara que sua majestade não invente de tomar banho de mar. Seria difícil ela entender o que significa "vazamento do emissário submarino".

A artista da Rede Globo Regina Casé causou certo incômodo com sua entrevista à Folha há dias. Houve protestos de leitores, muita gente não gostou da maneira como ela se referiu aos paulistanos, os quais, segundo a artista de TV, vivem um apartheid social que faria com que ricos e pobres jamais se misturassem.
Ela reclamava da baixa audiência de seu programa de TV na cidade e usou como contraponto para essa discrepância antidemocrática o que ela chamou de "neguinho abusado" do Rio. Esse, talvez, mais antenado com seu programa.
Sem querer entrar no mérito de quem é melhor para a audiência de Casé, se paulistanos ou cariocas, o fato é que ela cometeu uma expressão apropriada para os dias de hoje, o "neguinho abusado".
Supondo que o "neguinho" possa ser também um "branquinho", eis que estamos com abusados até a tampa. Do traficante que instala circuito de TV para controlar o tráfego ao banqueiro que salva a pele com o dinheiro do contribuinte e ainda tenta dar sopapos em jornalistas, passando por todos os que se reservam o direito de, abusadamente, permanecer calados.


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