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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
O resgate da nação
Quase 30 milhões de crianças e
adolescentes brasileiros vivem na
pobreza, muitos em extremos de miséria e de abandono, sem perspectiva
de levar uma vida diferente da vida
dos pais. De seu resgate depende o futuro do Brasil.
A melhor maneira de dar futuro a
eles, e portanto ao país, é tornar a
construção de um ensino público de
qualidade o objetivo supremo do governo, subordinando tudo a essa exigência. As iniciativas destinadas a aliviar, para esses jovens, os sofrimentos,
as humilhações e as incapacitações da
pobreza só serão efetivas se forem
acessórias ao esforço de educar.
As sondagens de opinião demonstram que nosso eleitorado coloca a
educação bem baixo na hierarquia de
suas preocupações. Por isso os marqueteiros aconselham os candidatos
presidenciais a prometer empregos,
segurança e saúde, e até estradas e
açudes, antes de chegar a esse primo
pobre das políticas públicas que é a capacitação dos brasileiros. Não importa. Um candidato demonstrará sua
devoção ao engrandecimento do Brasil e dos brasileiros insistindo que o
importante terá de aguardar até que se
faça o indispensável. E confiando em
sua capacidade de persuadir os eleitores dessa verdade dura e emancipadora.
No fundo, é muito simples. O Brasil
fervilha de energia e de engenho. De
tudo o que lhe falta, o que mais lhe falta é ensino público de qualidade para
dar destino construtivo a essa ebulição que se dissipa no ar. Qual o cidadão sensato que não trocaria um país
com estradas pavimentadas e gente
ignorante por outro com suas estradas
-e até com suas fábricas- destruídas, mas com população capacitada?
Este, ao contrário daquele, detém a
fonte da riqueza, o escudo da justiça e
a garantia da liberdade. Até solução
para os problemas das finanças públicas possui: os mercados emprestam, a
título longo, a quem tenha capacidade
para produzir; dos incapacitados, exigem retorno já.
Essa, só essa, é, portanto, a tarefa sagrada: construir ensino público que
abra para o país as portas de outro futuro. Mínimos de investimentos por
aluno e de desempenho por escola, asseguradas por mecanismos de investimento federal, de retribuição dentro
da Federação e de intervenção corretiva quando os mínimos deixarem de
ser satisfeitos. Pré-escolar e escola no
ciclo básico de tempo integral, salvando a criança pobre das mazelas do
meio e prestando-lhe ajuda alimentar
e médica abrangente. Universalização
da escola média. Pedagogia voltada
para capacitação, tanto conceitual
quanto prática, não para decoreba.
Formação de professores e de materiais pedagógicos para elevar a qualidade do ensino público a partir de
modelos de excelência que se multipliquem. Conquista da classe média para
a escola pública, como fiadora de sua
qualidade, em proveito de todos.
Oportunidades e apoios extraordinários, de avanço escolar e de subsídio
econômico, para o aluno pobre e aplicado. E, com tudo isso, dinâmica de
emulação e de esperança na sociedade
brasileira -não depois, mas já.
Quem conhece o assunto sabe que
tudo isso é factível com instrumentos
que já temos. Agora a tarefa é mostrar
ao povo brasileiro que esse é o caminho para soerguer a nação. É a redenção de nosso grande país e a justificativa de nossas vidas de cidadãos.
Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras nesta coluna.
www.law.harvard.edu/unger
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