São Paulo, segunda-feira, 08 de fevereiro de 2010

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Incerteza europeia

Crise cobra seu preço em países da periferia da UE; arcabouço institucional da região impõe medidas com alto custo político

OS MERCADOS financeiros globais vêm sendo sacudidos por uma nova onda de choque, derivada das incertezas sobre a capacidade de países da União Europeia de pagar suas crescentes dívidas públicas. O foco do momento é a Grécia, mas Portugal e Espanha podem ser os próximos a enfrentar maior dificuldade.
A montanha de dívida pública é o principal legado da crise financeira, especialmente no mundo desenvolvido. Os pacotes de estímulo fiscal, os custos de resgate dos bancos e o colapso da arrecadação de impostos são os fatores mais importantes por trás dessa dinâmica perversa.
O brutal aumento da dívida dos governos dos países ricos esperado para os próximos anos demandará um grande esforço de estabilização. Este é um dos principais riscos para a continuidade da recuperação global.
Nos EUA e no Reino Unido, a dificuldade principal é compatibilizar a saída da recessão com a necessidade de apertar o orçamento. O crescimento da economia poderá ser menor nos próximos anos. É possível que os mercados cobrem mais caro para rolar suas dívidas, mas um cenário de insolvência é improvável.
Os maiores problemas estão na periferia da comunidade europeia. Refletem a dificuldade de uma união monetária sem uma correspondente integração fiscal e do mercado de trabalho.
Na Espanha houve um surto de construção civil, financiado por capitais externos nos últimos anos. A inflação de preços e salários foi maior que no resto da comunidade e o país perdeu competitividade. O crescimento do desemprego após a crise -para nível próximo a 20%- decorre em parte destes desequilíbrios.
Por fim, a recessão jogou o orçamento público no vermelho, onde antes havia superavit. Já a Grécia é o caso mais dramático. Padece de problemas similares aos da Espanha, mas agravados pela frouxidão no orçamento nos anos que antecederam a crise. A relação dívida/PIB atingirá 120% em 2010. De todos, é o país mais perto da insolvência.
Desvalorizar a moeda nacional, se houvesse uma, seria uma alternativa para combater a recessão. Se o mercado de trabalho fosse de fato integrado ao do continente, a perda de competitividade seria menor. E se houvesse uma autoridade fiscal centralizada, o sofrimento do desemprego poderia ser minorado por maior ajuda do governo central -neste caso, de Bruxelas.
Mas nenhuma destas possibilidades está disponível para quem adotou o euro. A ajuda da comunidade é condicional: os países mais frágeis serão compelidos a realizar um draconiano regime de austeridade, visando estabilizar a dívida. O resultado será recessivo, com consequências políticas potencialmente explosivas.
Os mercados sabem disso e já aplicam pressão no elo mais fraco. O dilema da UE é complexo. Pode resgatar a Grécia, pois o país é pequeno em relação ao todo. Mas estará abrindo um precedente que pode minar a credibilidade do euro. Se impuser um ajuste duro demais, condenará o país a uma longa e dura recessão. E, mesmo assim, com o risco de ruptura no meio do caminho.
O drama parece estar apenas no começo.


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