São Paulo, segunda, 8 de fevereiro de 1999

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PAINEL DO LEITOR

Governabilidade
"Em artigo na Folha (Opinião, página 1-3, 25/1), sugeri que Fernando Henrique Cardoso deveria remeter ao Congresso emenda constitucional convocando novas eleições presidenciais. Sustentei que essa seria uma saída democrática para a atual crise de governabilidade, em face da falência econômica do país, da renúncia expressa à soberania nacional, decorrente do acordo com o FMI, e dos riscos políticos intrínsecos ao processo de desagregação social -para não falar na falta de legitimidade de um mandato construído por estelionato eleitoral.
Valendo-se da distorção e da manipulação, que no governo FHC tornaram-se métodos de fazer política, respeitáveis governistas, como Teotonio Vilela Filho, reagiram tentando imputar-me a pecha de "golpista' (Opinião, pág. 1-3, 26/1), manobrando para tentar desviar o debate do que é central: a ingovernabilidade do país e as alternativas democráticas para superá-la.
O falacioso argumento dos governistas não se sustenta nem mesmo diante das questões preliminares que podem ser interpostas: teria sido "golpista' o presidente quando, valendo-se exatamente do mesmo instrumento que estou sugerindo utilizar -emenda constitucional-, fez aprovar no Congresso a possibilidade da sua reeleição? Pode se considerar "guardião da Constituição' quem sonega os mais elementares direitos nela contidos, governa por medidas provisórias e sacrifica a soberania nacional?
A reação dos governistas foi em vão. A razão cínica já é impotente para ocultar o fundamento do seu sofisma: o que de fato não suportam é admitir que as mesmas instituições que sufocaram -Parlamento e Judiciário- possam, no legítimo exercício do poder constituinte e no estrito limite da Carta que eles desrespeitaram, afastar um governo que se impôs pelo autoritarismo, pela fraude e pela mistificação."
Tarso Genro, ex-prefeito de Porto Alegre e membro do Diretório Nacional do PT (Porto Alegre, RS)

Debates e democracia
"Fernando Henrique Cardoso recusou-se terminantemente a debater com seus adversários Lula e Ciro Gomes, que tentaram, inúmeras vezes, despertá-lo para seu esquecido senso democrático. Em vão. Nunca é tarde: mesmo já reconduzido ao cargo, é louvável a iniciativa de buscar debater com a sociedade soluções pendentes.
O ex-presidente Itamar Franco, hoje governador de Minas, preferiu seguir o exemplo do Fernando que ajudou a eleger (FHC), fugindo do debate; não seguiu o exemplo do Fernando com quem se elegeu (Collor), que participou de debates, venceu a eleição e, ao atuar em contradição com suas propostas de campanha, de forma amoral, sofreu o processo de impeachment. Itamar decretou a moratória de forma unipessoal, e as sociedades mineira e brasileira foram apanhadas de surpresa. Se tivesse participado de debates, talvez seus eleitores, visualizando suas pretensões, poderiam tê-lo julgado diferentemente nas urnas.
As leis eleitorais trazem consequências para os cidadãos da área territorial em que os líderes políticos vão atuar. A modernização da legislação eleitoral é primordial para legitimarmos políticos e propostas transparentes, não posteriormente definidas.
É uma pena que a sociedade brasileira ainda não tenha atingido maturidade política para exigir alterações que irão beneficiá-la. Essa atitude foi adotada pela sociedade norte-americana em 1959, ao pressionar o Congresso para que este viabilizasse a realização de debates televisivos, alterando a lei."
Fernando Marrey Ferreira (São Paulo, SP)

Mendigos de Corumbá
"Indignante e vil a atitude do prefeito de Corumbá (MS), sr. Éder Moreira Brambilla, ao promover uma espécie de faxina social em sua cidade (Cotidiano, 3 de fevereiro). A atitude de expulsar mendigos para outros Estados, mediante coação armada pela PM, lembra um dos piores momentos da história ocidental: a faxina étnica promovida por Adolf Hitler na Europa da primeira metade do século."
Daniel Chaves de Carvalho (Curitiba, PR)

Morte do presidente da Funai
"Estou indignado com a baixa repercussão da morte do presidente da Funai, Sulivan Silvestre. Aos 22 anos, já era promotor público. Aos 23, necessitava de guarda-costas, pois não tinha medo de enfrentar poderosos pela causa do meio ambiente, sendo constantemente ameaçado. Trabalhou com empenho em prol das vítimas do césio-137, em Goiânia. Foi, proporcionalmente ao tempo em que esteve na Funai, o presidente que mais reconheceu e demarcou terras indígenas. Não tinha medo; apenas grande sede de justiça.
Temo que por isso mesmo tenha morrido. Acredito, como sua mulher, que seu avião tenha sido sabotado. É uma pena ver como uma pessoa a quem deveríamos admirar como exemplo tenha se tornado mais um indício do "andar para trás' deste país. Alguém vai se mexer?"
Yuri V. Santos (São Paulo, SP)

Confisco à vista?
"Zélia Cardoso de Mello, ministra da Economia no governo Collor, disse que não se faz um confisco duas vezes no mesmo século. Só que o século termina daqui a pouco. Portanto, dentro desse raciocínio, a pergunta não seria se o governo vai confiscar as poupanças, mas quando."
João Manuel F. S. de Carvalho Maio (São José dos Campos, SP)

Nau sem rumo
"Na queda livre em que se encontra o país, assistir à contagem regressiva dos "500 anos do Brasil', encenada diariamente pela Rede Globo como preâmbulo do Jornal Nacional, torna-se desconfortante e embaraçoso. Com o governo aparentemente à deriva, exige-se a fé de uma velhinha de Taubaté para acreditar que nós vamos chegar lá."
Hanns John Maier (Ubatuba, SP)

Pena de morte
"Ao proclamar a necessidade de eliminar a pena capital (Mundo, 27 de janeiro), o papa João Paulo 2º se opõe diretamente à orientação de Jesus Cristo, que, no Apocalipse (13,10), diz nitidamente: "Quem mata pela espada deve morrer pela espada'. Se Jesus, o mais manso e humano dos legisladores, acha necessário matar a quem mata, é porque Ele vê nessa lei a única maneira de defender a vida dos inocentes contra a perversidade dos assassinos.
Na sua ânsia de poupar os criminosos, os corações sensíveis esquecem-se da lógica. A proibição de tirar a vida alheia é absoluta ou relativa? Se absoluta, não teremos o direito de nos defender e defender nossos pais e filhos contra um agressor, matando-o. Devemos deixar que nos mate (e mate nossos pais e filhos), porque, se ele desobedece à lei, nós não podemos imitá-lo.
Basta formular tais hipóteses para ver-lhes o absurdo. Há ocasiões em que o homem pode e deve matar. A proibição de tirar a vida alheia é, portanto, relativa e admite exceções, como o proclama o próprio Jesus Cristo. Cabe à sociedade definir essas exceções."
Mansour Challita (Rio de Janeiro, RJ)

Livros didáticos
"Dois mais dois são quatro; o rio Tietê, apesar de represado e poluído, continua no mesmo leito; "I love you' ainda quer dizer "eu te amo'; Caxias ainda é o patrono do Exército. Assim, não consigo entender, em um país que quer ser nação, com salário mínimo de apenas R$ 130, a substituição anual dos livros didáticos; ou seja, os livros descartáveis. Será que sobra dinheiro neste país? Ou alguém está bancando a corrupção no governo? Será que a educação é estojinho de primeiros socorros obrigatório, para enriquecer alguém?"
Ednir Salata (Botucatu, SP)



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