São Paulo, segunda-feira, 08 de março de 2004

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TENDÊNCIAS / DEBATES

A força das heroínas anônimas

MARIA LÚCIA ALCKMIN


Temos a sorte de contar com o exemplo de nossas Marias para mantermos nossa força e podermos ampliar nossa atuação

O Brasil é palco de artistas geniais. Poetas, músicos, dramaturgos, pintores que têm o dom de captar a essência da alma feminina, da alma singular da mulher brasileira. Munidos de sensibilidade e de talento, traçam um perfil fidedigno daquelas que são mestras em dar origem à vida, em cuidar, em amar, em realizar um exercício constante de doação. É o caso de Milton Nascimento e Fernando Brant, que na canção "Maria Maria" revelam: "Mas é preciso ter manha/ É preciso ter graça/ É preciso ter sonho sempre/ Quem traz na pele essa marca/ Possui a estranha mania de ter fé na vida".
São versos condizentes com a grandeza de nossas inúmeras heroínas anônimas. Marias especializadas em semear, em germinar, em florir o mundo com sua força, sua crença em novos amanhãs, sua coragem de seguir em frente a despeito das adversidades do caminho.
Nos 645 municípios do Estado de São Paulo, observamos, devido ao trabalho que desenvolvemos na presidência do Fussesp (Fundo Social de Solidariedade do Estado de São Paulo), a trajetória incrível dessas mulheres comprometidas com a construção de novos tempos. Marias guerreiras, que demonstram sua garra e determinação na luta diária pela sobrevivência. Trabalhadoras incansáveis, que se assemelham a um exército movido a amor, a intuição, a paciência, a capacidade de não se abater, de não se entregar. Virtudes advindas da imensa sabedoria que detêm.
Uma sabedoria que faz com que nós, do Fussesp, possamos aprender a cada dia com essas personagens da vida real. Líderes comunitárias, agentes sociais, estrelas do cotidiano que, com seu brilho e sua força, iluminam a jornada de milhões de paulistas e de brasileiros. É nosso compromisso lutar para propiciar a elas mecanismos que ampliem suas possibilidades de crescimento. Mecanismos traduzidos em projetos e programas que gerem renda, trabalho, cidadania. São cursos e capacitações que visam presentear essas Marias com uma forma mais segura e autônoma de obter o seu sustento, o de suas famílias e de suas comunidades.
Mulheres como Cleuza Ramos, do Morro Doce, na zona oeste da capital. Liderança cuja solidariedade serve de exemplo a todos. Ela montou, em parceria com o Fussesp, padarias artesanais com as quais ensina a população local a produzir pães. Alimento que mistura ingredientes como dignidade, auto-estima, autoconfiança, respeito. Valores que também são a base do trabalho de dona Lourdes, do Jardim Princesa, na zona norte -uma das primeiras a começar a produzir pães artesanais. Hoje ela abriga mais de 300 crianças, em duas creches, além de ter montado uma casa para capacitar a comunidade da região.
A mesma força rege dona Duda, que desempenha atividades essenciais às crianças carentes da favela Ayrton Senna, na zona sul. Ela mesma construiu um espaço próprio para receber a padaria artesanal do Fussesp, de modo que pudesse ensinar outras pessoas a fabricar os pães. Mas dona Duda vai além e também realiza um trabalho de inclusão social com dependentes químicos.
Já dona Sônia mantém no Tatuapé, na zona leste, um abrigo para crianças e adolescentes portadores de deficiência mental, dos quais 32 moram no local e outros 150 participam diariamente de programação especializada, fabricando, inclusive, o seu próprio pão artesanal e comercializando o excedente.
Essas são apenas algumas das quase 2.000 líderes comunitárias com as quais o Fussesp mantém uma sólida parceria. É nosso objetivo prosseguir desenvolvendo programas e criando espaços que resgatem a dignidade humana, estimulem a capacitação profissional e a geração de emprego e renda. Espaços como a Casa da Solidariedade, que atende crianças e adolescentes carentes. Local onde proporcionamos alimentação balanceada, acompanhamento nos estudos, atendimento médico, odontológico e psicológico. Ou como a Estação Especial da Lapa, um centro de convivência também voltado às pessoas portadoras de necessidades especiais. Lá elas fazem cursos profissionalizantes, oficinas culturais e atividades esportivas. São instituições que funcionam como modelo de excelência para outros estados do Brasil e também para outros países.
Temos a sorte de contar com o exemplo de nossas Marias para mantermos nossa força e, assim, podermos ampliar nossa atuação. Para isso, temos firmado parcerias imprescindíveis com empresas privadas e entidades como Sebrae, Senai e Senac. É uma forma de interagirmos com a sociedade civil organizada, beneficiando um número cada vez maior de pessoas.
Hoje, o maior desafio do Fussesp é seguir à risca o lema que nos foi gradativamente ensinado por nossas Marias: "Melhor do que dar é ensinar a fazer". Que elas continuem sendo o nosso norte, nosso porto seguro. Guias especializadas em nos mostrar, sobretudo, a beleza da jornada e a grandeza do ser feminino.


Maria Lúcia Alckmin, 52, primeira-dama do Estado de São Paulo, é presidente do Fundo Social de Solidariedade.


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