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A POLÍTICA COMO NEGÓCIO
Colhido de surpresa pela entrevista do presidente do PTB,
Roberto Jefferson, publicada na segunda-feira por esta Folha, o governo petista, no momento em que via
crescer as chances de barrar a CPI
dos Correios na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ), foi
obrigado a recuar e mudar de tática.
Aqueles que vinham considerando a
investigação parlamentar desnecessária passaram a apoiá-la. Houve
também os que aventaram a hipótese
de criar uma nova comissão para investigar a compra de votos -que poderia se estender a fatos ocorridos na
gestão anterior.
Acuado e procurando, com atraso,
evitar que se consolide a idéia de que
há conivência do governo com operações nebulosas, o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva demitiu as diretorias dos Correios e do Instituto de
Resseguros do Brasil e, em discurso
no 4º Fórum Global de Combate à
Corrupção, assegurou que não irá
"acobertar ninguém". "Cortaremos
na própria carne", prometeu o primeiro mandatário, que mencionou a
necessidade de uma reforma política
no país. Por sua vez, o presidente do
PT, José Genoino, disse que agora o
partido participará da CPI e defenderá seu "patrimônio ético".
Os esforços do presidente e da direção de seu partido talvez melhorem
um pouco a imagem do governo,
mas dificilmente irão mudar a crescente percepção de que a política nacional se tornou um grande mercado
no qual decisões do Legislativo e do
Executivo, com revoltante assiduidade, são objeto de operações de compra e venda. Medidas Provisórias,
projetos de lei, concorrências e licitações, nada parece escapar da lógica
mercantil, que se instaura já no processo de financiamento de campanhas, quando doadores "investem"
em candidatos com o intuito de colher vantagens no futuro.
Tal realidade, como se sabe, não é
nova. Embora a adesão ao fisiologismo do governo Lula possa parecer
mais chocante, à luz da atuação pregressa do PT, os "companheiros" no
poder dão prosseguimento a um padrão já estabelecido. Não há muita
diferença entre o "mensalão" de hoje
e a compra de votos para aprovar a
emenda da reeleição em 1997, também revelada por esta Folha.
Partindo do pressuposto de que
tanto o então presidente Fernando
Henrique Cardoso quanto Lula têm
compromissos éticos e prefeririam
que as decisões políticas fossem pautadas o máximo possível por convicções e projetos de interesse do país,
travando-se a disputa dentro dos limites republicanos, é inevitável
constatar que uma força maior acaba
por se impor, transformando o Executivo em refém de parlamentares
interessados sobretudo em extrair
benefícios pessoais da vida pública.
Não se trata, obviamente, de atribuir as virtudes ao Executivo e os vícios ao Legislativo, mesmo porque
houve ocasiões, como no governo de
Fernando Collor de Mello, em que o
Congresso Nacional interpretou a
vontade nacional de moralização da
política e promoveu um histórico
processo de impeachment. O que é
preciso reconhecer é que ambos,
Executivo e Legislativo, têm naufragado no mesmo sistema político-partidário invertebrado que, apesar
dos notáveis avanços democráticos
das últimas décadas, ainda carece de
reformas profundas.
Já se procurou atribuir à moralidade na política uma característica própria, mais elástica e diversa daquela
que regeria a vida privada, mas ainda
que alguém queira aceitar diferenças
entre essas esferas, o que se observa
no Brasil ultrapassa todos os limites.
É, portanto, a própria instituição
política, tal como hoje se desenha,
que vai sendo posta em xeque com
esses infindáveis casos de corrupção.
É preciso que ao menos os melhores
entre aqueles que a sociedade escolheu para administrar a República tenham consciência de que o país se
encontra diante de desafios mais
graves do que apenas punir um ou
outro político corrupto -o que, de
resto, é indispensável.
É de lamentar que, nesse cenário, o
PT, cujo histórico o credenciava a assumir o papel de liderança moral
num processo de reforma, tenha tão
rapidamente cedido ao "realismo"
de uma política que cada vez mais se
exerce como negócio.
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