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TENDÊNCIAS/DEBATES
O Brasil deve extinguir a reeleição e
restaurar o mandato presidencial de 5 anos?
SIM
Quando o dobro rende a metade
JUTAHY MAGALHÃES JR.
A POSSIBILIDADE DE reeleição
para os cargos de presidente da
República, governador e prefeito é, com efeito, recente em nossa
história. Ao longo de oito anos, realizaram-se quatro pleitos sob tal regra.
Se a experiência é curta, já se mostra,
no entanto, deletéria o bastante para
podermos concluir: mais cria vícios
do que virtudes; mais conspira contra
a gestão pública do que lhe dá qualidade. Ademais, se não há tempo bastante para um bom governante, quatro anos bastam.
Embora o meu partido, o PSDB, tenha sido o primeiro a propor a reeleição, sinto-me à vontade para me manifestar contra. À época, não votei a
emenda que tratou do tema. Ainda
que o tivesse feito, acho que teria clareza para perceber o equívoco. Por isso, apresentei, em 2004, proposta que
extingue a reeleição e estabelece o
mandato único de cinco anos.
Argumenta-se, contra a proposta,
uma questão menor, circunstancial:
ela instituiria eleições anuais no Brasil, nos vários níveis, já que não poderia haver prorrogação de mandatos
parlamentares. Pois bem: fiquemos,
então, com quatro anos, não cinco.
Ao contrário do que se diz, a reeleição foi, sim, suficientemente testada
no Brasil. Afinal, a possibilidade estendeu-se às 27 unidades da Federação e aos 5.561 municípios do país.
Pode-se afirmar, portanto, que ela foi
examinada milhares de vezes.
Desse balanço, resta evidente que
traz mais prejuízos do que vantagens.
Estou convicto de que sua extinção
fortalece a democracia, os partidos e
os mecanismos de controle da gestão
da máquina pública.
A possibilidade de reeleição contamina, desde o primeiro dia, a relação
entre o mandatário e as forças políticas. A governabilidade presente fica
condicionada por perspectivas futuras e elas são sempre maiores para
quem pode, se quiser, usar os poderes
do cargo para nele permanecer.
Amarrada em tal camisa-de-força,
a política se amesquinha. Estarão certos os que disserem que tudo dependerá da moralidade de cada governante. Por isso mesmo é melhor nos
subordinarmos à solidez das instituições do que à tentação das vontades.
A reeleição também tem causado
prejuízos à vida partidária, retardando o ciclo de renovação das lideranças. Ela alimenta uma espécie de culto à personalidade do governante, que
resulta no menoscabo às políticas que
visam ao interesse público.
Não contribuindo para o fortalecimento do ambiente democrático, a
reeleição causa distorções imensas
no processo eleitoral, dada a assimetria que estabelece entre os que buscam um novo mandato no exercício
do cargo e aqueles que têm de lutar
contra o aparato estatal.
A atual disputa pela Presidência da
República, por exemplo, é pródiga
nesse aspecto: basta ver a farra que o
governo Lula vem promovendo, com
o aumento dos gastos públicos e a
mais deslavada avalanche publicitária de que se tem notícia.
Sim, indivíduos regidos pelo mesmo código têm comportamentos distintos. O presidente FHC, em 98, respeitou os limites legais; a agenda do
governante não foi montada para servir aos interesses do presidente-candidato, tanto que aquela é considerada a eleição de menor exposição na
mídia em muitos anos.
FHC e Lula: dois governantes, dois
estilos, duas pessoas distintas, embora resguardadas por um mesmo aporte constitucional. Num caso, respeito
à lei; no outro, uso da máquina. É a
prova de que o país precisa depender
menos das virtudes dos indivíduos e
mais das virtudes da lei. Porque, assim, os não-virtuosos serão tolhidos.
Por fim, a possibilidade de reeleição acaba funcionando como uma armadilha perversa para o governante,
com evidentes prejuízos para a população. Em busca da popularidade nos
primeiros anos, ele tende a evitar decisões que possam lhe render desgaste. À medida que o pleito vai se aproximando, exacerba as decisões de caráter eleitoreiro. Num e noutro extremos, minam-se os espaços para que a
gestão pública seja conduzida de maneira responsável.
Um bom governante, que sabe o
que quer, tem rumo e programa, pode
fazer, a cada dia de um mandato de
quatro anos, o que um outro, sem essas mesmas qualidades, não faria em
oito. A reeleição, com raras exceções,
tem servido para que se governe o dobro, rendendo a metade.
JUTAHY MAGALHÃES JR. é deputado pela Bahia e líder
da bancada do PSDB na Câmara.
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