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CLÓVIS ROSSI
De filas, regras e combates
FRANKFURT- Começo por onde
Fernando Rodrigues terminou ontem o seu belo texto: "Palocci é o
Brasil".
Se alguém teve o azar de não ter
lido, trata-se da crítica ao ato de furar a fila (em Cumbica), praticado
pelo ex-ministro, ao qual se somou
uma "desculpa deslavada".
É dessa malandragem que foram
nascendo os grandes males da pátria. Desrespeita-se uma regra comezinha (ficar na fila como qualquer mortal), no pressuposto de
que o dano aos outros é mínimo,
quase zero. Uma pessoa que fure a
fila não vai atrasar muito o já muito
atrasado embarque dos demais passageiros, certo?
Errado. Quando uma figura pública desrespeita uma "regrinha"
emite o sinal de que regras, grandes
ou pequenas, não foram feitas para
serem respeitadas. E tome o desrespeito que se vê e se lê todos os dias
em jornais e telejornais.
No limite, chega-se à frase do governador Sérgio Cabral (Rio de Janeiro): "Se o tiro foi pela frente ou
pelas costas, isso é da natureza do
combate (...) Barbaridade para mim
é espancarem uma empregada em
um ponto de ônibus".
É claro que espancar alguém em
qualquer lugar é uma barbaridade.
É claro que, em combate, um tiro
pode, sim, atingir alguém pela frente ou pelas costas. Mas o elementar
respeito às regras pede que não se
dê alvará para matar antes de que
termine a apuração para saber se as
vítimas no complexo do Alemão foram mortas em combate ou fuziladas após a rendição.
Convém lembrar que a deterioração da segurança pública entrou em
fase aguda a partir do momento em
que o regime militar deu licença aos
porões repressivos para violar a lei
e matar e cometer outros crimes
em nome do combate a um comunismo supostamente onipresente.
Autorizar a violação da regra por
um motivo escancara as portas para
violá-las sempre. Deu no que se vê
todos os dias.
crossi@uol.com.br
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