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CLÓVIS ROSSI
Reforma, mercado e Estado
SÃO PAULO - Da catarata de palavras usadas para falar das reformas,
convém que o leitor retenha frase
curta e grossa de Paulo Vieira da Cunha, economista-chefe do HSBC (nos
EUA), conforme relato de Fernando
Canzian: o importante para o mercado é que as reformas coloquem o Brasil "em uma posição de garantir o pagamento, no futuro, de suas dívidas
interna e externa".
Portanto, caro leitor, interesse nacional, crescimento econômico, equidade, eliminação de privilégios, tudo
isso é besteira ou, no mínimo, secundário, desde que o Brasil continue
sendo bom pagador.
Isso não quer dizer que a reforma
não seja necessária. Artigo dos economistas Hélio Zylberstajn, André
Souza, Anderson Stancioli e Marcelo
Milan publicado anteontem pela Folha apresenta convincentes argumentos sobre "transferências regressivas" de renda no sistema atual.
Mas o artigo convence quantitativamente, não qualitativamente. O
que quase todo o mundo chama de
"privilégios" do funcionalismo público inclui, de fato, privilégios, mas inclui também benefícios que anulam a
vantagem de trabalhar para o setor
privado.
Ou, para fazer uma comparação
meio grosseira: é preciso tornar
atraente a profissão de policial, porque, renda por renda, traficar cocaína dá muito mais.
Mesmo que se queira uma comparação com atividades lícitas, também
rende mais prestar serviço de consultoria em segurança ao setor privado
do que tentar aumentar a segurança
do público servindo à polícia.
Na análise da reforma previdenciária, o contraponto perfeito à frase de
Paulo Vieira da Cunha veio de Vinicius Torres Freire, neste mesmo espaço, ontem: "Ninguém discutiu a sério
que Estado se quer".
Se se discutisse, verificar-se-ia que
um Estado decente, que se supõe seja
a meta de todos, salvo um ou outro
tarado, custa mesmo caro. Policial
bom e barato, professor bom e barato, médico bom e barato dá no que
deu a política do Palmeiras de "bom
e barato": segunda divisão.
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