São Paulo, sábado, 08 de agosto de 2009

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TENDÊNCIAS/DEBATES


Grandes cidades, como São Paulo, devem implementar o serviço de mototáxi?

NÃO

A obrigação de proteger vidas

ALEXANDRE DE MORAES

PREMIDOS PELOS estreitos prazos de entrega ou pelo natural espírito de aventura da juventude, mais de 300 mil motociclistas saem às ruas de São Paulo, diariamente, dispostos a se arriscarem em manobras perigosas entre carros, ônibus e caminhões. Essa realidade se reflete em uma estatística profundamente preocupante: o alto número de acidentes envolvendo motociclistas.
Reverter esse quadro é tarefa gigantesca, à qual se dedicam os gestores de trânsito da cidade. Cursos gratuitos de direção segura, fiscalização nas ruas e criação de faixa exclusiva para o tráfego de motocicletas são algumas das iniciativas adotadas pela prefeitura no intuito de reduzir os acidentes com motocicletas.
Os resultados são positivos, mas ainda não satisfatórios diante da urgência da situação e do tamanho do esforço que é feito. O número de acidentes cresce, embora em ritmo bem inferior ao registrado anteriormente e muito abaixo do aumento da frota de motocicletas da cidade.
De 2007 para 2008, a quantidade de acidentes com motocicletas cresceu 6%, percentual significativamente menor do que o aumento da frota, que foi de 15% no mesmo período.
Mas pessoas são pessoas, e não há estatística que possa consolar a perda da saúde ou de um familiar querido. Por isso, não há argumento que possa ser usado para tornar maior o risco para aqueles que são a parte mais vulnerável do trânsito: os que circulam a bordo de bicicletas e motocicletas.
A legalização da atividade de mototaxista em São Paulo aumentaria ainda mais a quantidade de pessoas expostas aos perigos que hoje são enfrentados por aqueles que circulam de motocicleta na capital. Pior ainda.
O novo contingente é inexperiente e estaria sempre sob a pressão do tempo, uma vez que só opta por esse meio de transporte os que precisam chegar muito rápido aos seus destinos.
Além disso, estudos indicam que a falta de familiaridade com o veículo faz com que o passageiro tente compensar a inclinação do motorista nas curvas, o que provoca desequilíbrio e pode levar à queda.
Ou seja, nada justifica a irresponsabilidade de permitir que a fugaz necessidade de algumas pessoas de economizar cinco ou dez minutos as leve a embarcar em viagem tão arriscada.
Entre as atribuições do poder público está a de zelar pela segurança dos cidadãos, e entre as atribuições da Secretaria Municipal de Transportes está a de promover a segurança de motoristas e passageiros, acima da obrigação de organizar e fazer fluir o trânsito.
Porém, mesmo analisando a situação sob o olhar frio de alguém cuja única preocupação fosse garantir a fluidez do trânsito, a liberação da atividade de mototáxi seria totalmente desaconselhável.
Basta analisar o número de acidentes nos quais as motocicletas se envolvem e avaliar as consequências para o trânsito da cidade. No ano passado, os motociclistas estiveram presentes em 60% dos acidentes com vítimas ocorridos em São Paulo. Isso mesmo, com apenas 12% da frota, as motos participam de mais da metade dos acidentes com vítima.
Desnecessário dizer que essas ocorrências se concentram nas vias com maior número de veículos, ou seja, os principais corredores da cidade, tais como as marginais Tietê e Pinheiros e a avenida 23 de Maio.
No caso de acidentes com vítimas, não basta remover o veículo da pista, é preciso aguardar a chegada da perícia e do resgate. Durante essa espera, uma ou mais faixas ficam interditadas, e as longas filas de veículos se formam. Um obstáculo que impeça a livre circulação por 15 minutos em vias de tráfego intenso gera um congestionamento de aproximadamente 3 km. A regulamentação de mototáxis só virá contribuir para fazer com que o problemático trânsito paulistano tenha um agravante a mais.
Portanto, sob qualquer ponto de vista, tanto o humano, quanto o prático, a legalização da atividade de mototaxista é indefensável em São Paulo, uma metrópole em que o grande desafio para a prefeitura é melhorar a qualidade de vida de seus habitantes, buscando dar as condições necessárias para que eles saiam e voltem às suas casas com segurança e, de preferência, com rapidez.


ALEXANDRE DE MORAES , 40, professor doutor e livre-docente de direito constitucional da USP e do Mackenzie, é secretário municipal de Transportes e de Serviços de São Paulo. Foi secretário estadual da Justiça de SP (2002-2005) e membro do Conselho Nacional de Justiça.

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