|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
Grandes cidades, como São Paulo, devem implementar o serviço de mototáxi?
NÃO
A obrigação de proteger vidas
ALEXANDRE DE MORAES
PREMIDOS PELOS estreitos prazos de entrega ou pelo natural
espírito de aventura da juventude, mais de 300 mil motociclistas
saem às ruas de São Paulo, diariamente, dispostos a se arriscarem em
manobras perigosas entre carros,
ônibus e caminhões. Essa realidade se
reflete em uma estatística profundamente preocupante: o alto número de
acidentes envolvendo motociclistas.
Reverter esse quadro é tarefa gigantesca, à qual se dedicam os gestores de trânsito da cidade. Cursos gratuitos de direção segura, fiscalização
nas ruas e criação de faixa exclusiva
para o tráfego de motocicletas são algumas das iniciativas adotadas pela
prefeitura no intuito de reduzir os
acidentes com motocicletas.
Os resultados são positivos, mas
ainda não satisfatórios diante da urgência da situação e do tamanho do
esforço que é feito. O número de acidentes cresce, embora em ritmo bem
inferior ao registrado anteriormente
e muito abaixo do aumento da frota
de motocicletas da cidade.
De 2007 para 2008, a quantidade
de acidentes com motocicletas cresceu 6%, percentual significativamente menor do que o aumento da frota,
que foi de 15% no mesmo período.
Mas pessoas são pessoas, e não há
estatística que possa consolar a perda
da saúde ou de um familiar querido.
Por isso, não há argumento que possa
ser usado para tornar maior o risco
para aqueles que são a parte mais vulnerável do trânsito: os que circulam a
bordo de bicicletas e motocicletas.
A legalização da atividade de mototaxista em São Paulo aumentaria ainda mais a quantidade de pessoas expostas aos perigos que hoje são enfrentados por aqueles que circulam
de motocicleta na capital. Pior ainda.
O novo contingente é inexperiente e
estaria sempre sob a pressão do tempo, uma vez que só opta por esse meio
de transporte os que precisam chegar
muito rápido aos seus destinos.
Além disso, estudos indicam que a
falta de familiaridade com o veículo
faz com que o passageiro tente compensar a inclinação do motorista nas
curvas, o que provoca desequilíbrio e
pode levar à queda.
Ou seja, nada justifica a irresponsabilidade de permitir que a fugaz necessidade de algumas pessoas de economizar cinco ou dez minutos as leve
a embarcar em viagem tão arriscada.
Entre as atribuições do poder público está a de zelar pela segurança
dos cidadãos, e entre as atribuições da
Secretaria Municipal de Transportes
está a de promover a segurança de
motoristas e passageiros, acima da
obrigação de organizar e fazer fluir o
trânsito.
Porém, mesmo analisando a situação sob o olhar frio de alguém cuja
única preocupação fosse garantir a
fluidez do trânsito, a liberação da atividade de mototáxi seria totalmente
desaconselhável.
Basta analisar o número de acidentes nos quais as motocicletas se envolvem e avaliar as consequências para o trânsito da cidade.
No ano passado, os motociclistas
estiveram presentes em 60% dos acidentes com vítimas ocorridos em São
Paulo. Isso mesmo, com apenas 12%
da frota, as motos participam de mais
da metade dos acidentes com vítima.
Desnecessário dizer que essas
ocorrências se concentram nas vias
com maior número de veículos, ou seja, os principais corredores da cidade,
tais como as marginais Tietê e Pinheiros e a avenida 23 de Maio.
No caso de acidentes com vítimas,
não basta remover o veículo da pista,
é preciso aguardar a chegada da perícia e do resgate. Durante essa espera,
uma ou mais faixas ficam interditadas, e as longas filas de veículos se formam. Um obstáculo que impeça a livre circulação por 15 minutos em vias
de tráfego intenso gera um congestionamento de aproximadamente 3 km.
A regulamentação de mototáxis só
virá contribuir para fazer com que o
problemático trânsito paulistano tenha um agravante a mais.
Portanto, sob qualquer ponto de
vista, tanto o humano, quanto o prático, a legalização da atividade de mototaxista é indefensável em São Paulo,
uma metrópole em que o grande desafio para a prefeitura é melhorar a
qualidade de vida de seus habitantes,
buscando dar as condições necessárias para que eles saiam e voltem às
suas casas com segurança e, de preferência, com rapidez.
ALEXANDRE DE MORAES , 40, professor doutor e livre-docente de direito constitucional da USP e do Mackenzie,
é secretário municipal de Transportes e de Serviços de
São Paulo. Foi secretário estadual da Justiça de SP (2002-2005) e membro do Conselho Nacional de Justiça.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Lucas Pimentel: Regulamentação pela segurança
Índice
|