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São Paulo, domingo, 09 de março de 2003

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VÔO DE GALINHA

A recente melhora nos indicadores de risco, em especial o novo humor nos mercados financeiros em relação ao Brasil, é mais uma bolha especulativa.
O governo Lula também nisso repete a coreografia do governo FHC. Apressa-se a comemorar uma suposta melhoria estrutural na economia, apresentando-a como resultado do acerto da política econômica.
Esses períodos de alívio conjuntural foram certa vez batizados pelo economista Luiz Carlos Mendonça de Barros de "vôos de galinha". A economia parece que vai decolar, mas não tem como sustentar-se.
O contexto internacional piorou muito, os riscos de alta da inflação no Brasil continuam presentes, há gargalos estruturais na capacidade produtiva e grandes empresas em setores estratégicos, como eletricidade, estão inadimplentes.
Nada garante uma retomada do crescimento no curto ou no médio prazo. O principal instrumento da política econômica, o regime de metas inflacionárias, está sob suspeita.
Mas o humor dos mercados melhorou. Aumentou a procura por ativos de países percebidos pela comunidade financeira internacional como arriscados. Houve uma valorização de papéis da dívida brasileira.
O risco-país chegou a pouco mais de 1.100 pontos na semana passada e o dólar voltou ao patamar de R$ 3,50. Alguns bancos voltaram a captar recursos no exterior. E o saldo da balança comercial brasileira, principal fonte de divisas para o país, vem crescendo. Pode aumentar ainda mais se o cenário na Argentina melhorar.
A questão crucial é saber se está em curso uma real melhora nas perspectivas da economia brasileira ou se, como já se viu tantas vezes desde a crise asiática, trata-se apenas de um respiro, um momento em que ganha força nos mercados financeiros a hipótese de que "o pior já passou".
Mais que interpretações psicológicas para o comportamento dos investidores, no entanto, a melhoria observada parece refletir principalmente o aumento na diferença entre juros internos e externos.
Num momento em que o Brasil gera saldos comerciais e faz um forte aperto fiscal, o investidor e os bancos ficam relativamente mais dispostos a apostar em operações de curto prazo cujos ganhos resultam da diferença entre taxas de juros.
Daí a crer que a política econômica brasileira inspire uma confiança no longo prazo ou que o país esteja pronto para retomar o crescimento há uma grande distância.
A lógica financeira mais uma vez submeteu o Estado brasileiro a uma ciranda de curto prazo cujos ganhos são insustentáveis no longo prazo. Há um limite para subir os juros, cortar gastos e aumentar impostos. Enquanto esse limite parece contornável, a gincana prossegue.


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