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"Distritão" artificial
Congresso reabre discussão extemporânea sobre reforma eleitoral e se apequena mais uma vez perante os outros Poderes da República
Sempre que se inicia um mandato presidencial e toma posse
uma nova legislatura, ressurgem
alguns debates improdutivos, como a famigerada reforma política.
Em sua atual reencarnação, o
espectro materializou-se sob a forma do "distritão", entre outras
propostas brotadas no vácuo do
verão parlamentar. A ideia, defendida por caciques do PMDB, alteraria o modo de eleger deputados
federais, o que em tese favoreceria
grandes partidos.
Pelo sistema atual, o número de
vagas obtidas na Câmara por um
partido ou uma coligação é proporcional ao total de votos obtidos
pela legenda (com base no chamado "quociente eleitoral"). Candidatos célebres, que atraem
grande número de votos, ajudam
a eleger nomes obscuros, mesmo
numa agremiação pequena.
A alternativa em consideração
transformaria todo um Estado, ou
regiões inteiras, num grande distrito eleitoral. O quociente deixaria de existir, e se elegeriam ali todos os deputados mais sufragados, pela ordem de votação individual. É o sistema majoritário vigente na eleição a senador quando há duas vagas em jogo.
Há quem defenda o "distritão"
por razões doutrinárias, mas elas
não se acham na primeira linha de
motivações de quem o propõe. Simulações indicam que o PMDB veria sua bancada inchar de 78 para
88 deputados, caso a regra estivesse em vigor na última eleição.
Nas duas últimas décadas, nada menos que 300 iniciativas do
gênero emergiram e submergiram
no Congresso, um bom indicador
da fatuidade dessa discussão. As
modificações políticas mais fundamentais foram produzidas
alhures, no Poder Judiciário (Tribunal Superior Eleitoral e Supremo Tribunal Federal, no caso).
Foi assim com a fidelidade partidária. E também com a Lei da Ficha Limpa, que, embora nascida
de iniciativa popular e aprovada
no Congresso Nacional, teve sua
aplicação no pleito de 2010 determinada pelo TSE.
Ocorre que a Ficha Limpa ainda
se encontra "sub judice". O STF,
agora com time completo de 11 ministros, pode desempatar a votação sobre o tema e reverter a decisão do TSE, o que implicaria desempossar alguns parlamentares
e empossar outros. Uma legislatura que não tem certeza nem de sua
própria composição se entrega a
um debate fútil sobre como se escolheria a próxima.
É a discussão errada na hora errada. Ela apenas abrirá novas
frentes para o que se tem chamado
de "judicialização da política", a
qual pode ter rendido alguns efeitos positivos, mas que sem dúvida
é mais uma expressão do apequenamento do Legislativo diante dos
outros Poderes da República.
Há matérias mais importantes
do que o "distritão" para o Congresso enfrentar e decidir. A mais
urgente: como pretende retomar a
iniciativa legislativa hoje usurpada pelo Executivo, que governa
por medidas provisórias sem a urgência nem a relevância exigidas
pelo artigo 62 da Constituição.
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