São Paulo, sábado, 09 de julho de 2011

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O BNDES deve participar de projetos com elevado retorno individual?

NÃO

Banco deve se pautar por retorno social

MANSUETO ALMEIDA

Há um grande debate quanto à atuação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES, e de seu braço de aplicação no mercado de ações, o BNDES Participações (BNDESPar).
É claro que nem o BNDES nem mesmo o BNDESPar devem se comportar como uma espécie de hospital de empresas em dificuldades por conta de estratégias equivocadas dos seus administradores e acionistas. Da mesma forma, as aplicações do BNDES ou do BNDESPar não devem se pautar pelo critério do maior lucro esperado, porque, para isso, existem fundos de investimento privados e investidores individuais.
Se o BNDESPar pautasse sua atuação pela busca de projetos de maior retorno individual, essa empresa pública passaria, cada vez mais, a investir naquelas empresas mais competitivas e em setores em que o país já tem uma clara vantagem comparativa.
Esse tipo de atuação não apenas prejudicaria o desenvolvimento do mercado de capitais como também prejudicaria a boa governança das empresas brasileiras, pois as maiores exigências de transparência para conseguir parceiros privados para investimento passariam a ser um critério secundário diante do maior ou menor acesso privilegiado a autoridades governamentais.
O caso recente da fusão Pão de Açúcar/Carrefour, com eventual participação de R$ 4 bilhões do BNDESPar, gerou o saudável debate sobre a atuação do BNDES.
Esse caso é apenas um entre vários nos quais o BNDESPar aportou recursos públicos com atuação mais parecida a um fundo de investimento privado do que à de uma empresa de investimento pública, que deve pautar sua atuação em projetos de maior retorno social ou em projetos de inovação, ligada a novas tecnologias ou à descoberta de vantagens comparativas.
Projetos de infraestrutura complexos, que exigem elevados volumes de recursos e de retorno social elevado, são candidatos naturais à possível participação de bancos públicos, mesmo que o retorno individual de alguns desses projetos seja baixo. No caso de investimento privado, o BNDES (e o BNDESPar) poderia se espelhar em algumas experiências internacionais.
No Chile, a produção de salmão em cativeiro e sua exportação decorreram de uma experiência de sucesso da Fundación Chile (uma instituição com orçamento anual de US$ 30 milhões). Tão logo se constatou que a atividade era economicamente viável, a produção de salmão foi vendida para empresa privada; outras empresas privadas, posteriormente, investiram na atividade, que se provou lucrativa.
No caso do fundo de "venture capital" Yozma, em Israel, o governo estabeleceu uma parceria com fundos privados, em 1992, para investir em empresas de base tecnológica.
O setor público colocou US$ 8 milhões para cada US$ 20 milhões de recursos privados; os investidores privados tinham opção de compra da participação do governo em até cinco anos. Um investimento inicial minoritário do setor público, de US$ 100 milhões, gerou, depois de dez anos, um valor de mercado de US$ 2,9 bilhões.
O BNDES tem autonomia de empréstimos anuais de quase R$ 100 bilhões, e o BNDESPar tem carteira de ações de mais de R$ 90 bilhões.
Recursos mais que suficientes para atuar como banco público, mas insuficientes se esse banco quiser ser o grande investidor "privado" na economia brasileira.

MANSUETO ALMEIDA é pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A opinião expressa é a do autor, não exprimindo o ponto de vista do Ipea.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


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